segunda-feira, 30 de novembro de 2009

O PERMANENTE E O PROVISÓRIO

Por Martha Medeiros

O casamento é permanente, o namoro é provisório.
O amor é permanente, a paixão é provisória.
Uma profissão é permanente, um emprego é provisório.
Um endereço é permanente, uma estada é provisória.

De acordo? Nem eu.

Um casamento que dura 20 anos é provisório. Não somos repetições de nós mesmos, a cada instante somos surpreendidos por novos pensamentos que nos chegam através da leitura, do cinema, da meditação. O que eu fui ontem e anteontem já é memória. Escada vencida degrau por degrau, mas o que eu sou neste momento é o que conta, minhas decisões valem para agora, hoje é o meu dia, nenhum outro.

Amor permanente... Como a gente se agarra nessa ilusão. Pois se nem o amor por nós mesmos resiste tanto tempo sem umas reavaliações. Por isso nos transformamos, temos sede de aprender, de nos melhorar, de deixar pra trás nossos imensuráveis erros, nossos achaques, nossos preconceitos, tudo o que fizemos achando que era certo e agora condenamos. O amor se infiltra dentro de nós, mas seguem todos em movimento: você, o amor da sua vida e o que vocês sentem, tudo pulsando independentemente, e passíveis de desgarrar um do outro.

Um endereço não é pra sempre, uma profissão pode ser jogada pela janela, a amizade é fortíssima até encontrar uma desilusão ainda mais forte, a arte passa por ciclos, e se tudo isso é soberano e tem valor supremo, é porque hoje acreditamos nisso, hoje somos superiores ao passado e ao futuro, agora é que nossa crença se estabiliza, a necessidade se manifesta, a vontade se impõe-até que o tempo vire.

Faço menos planos e cultivo menos recordações. Não guardo muitos papéis, nem adianto muito o serviço. Movimento-me num espaço cujo tamanho me serve, alcanço seus limites com as mãos, é nele que me instalo e vivo com a integridade possível. Canso menos, me divirto mais e não perco a fé por constatar o óbvio: tudo é provisório, inclusive nós.


sábado, 28 de novembro de 2009

VAMPIROS


Eles estão por toda a parte, agora mais do que nunca. Charmosos, sensuais, notívagos, pálidos, de olhos coloridos, sugadores de sangue e extremamente sedutores. Vampiros vivem no imaginário coletivo há muito tempo, no meu desde que comecei a me entender por gente aos 10 anos, quando ficava hipnotizado na frente da televisão as 19:00 de um longínquo 15 de julho de 1991 para assistir, ou melhor, venerar a novela Vamp. Foi a partir daí que iniciou-se meu fascínio por esses seres míticos e fantásticos. Natasha, vivida pela maravilhosa atriz Claudia Ohana, em um de seus mais esplendorosos momentos na tv, era o meu sonho, meu modelo ideal de vampira, linda, sensual, talentosa, bondosa e atormentada pelo fardo de ser uma criatura das trevas. Cantava, seduzia multidões com sua música e beleza e longe dos palcos, sozinha e solitária, chorava lágrimas de sangue. Eu queria ser Natasha, a vampira do bem que num ato de extremo desespero vende sua alma ao diabo em troca de fama e sucesso como cantora. Em pouco tempo brilha ao gravar o clip da música Simpathy For The Devil nas ruas de Veneza, mas está condenada ao amor eterno do poderoso e cruel conde Vlad, o vampiro que a mordeu.

No trajeto de casa pra escola eu ia fantasiando que um vampiro poderoso me perseguia e me atacava no meio da rua, me transformando. Chegava na escola e na hora do recreio com uma dentadura de plástico e um sobre-tudo preto da minha mãe subia no púlpito onde a bandeira era hasteada e fazia a performance de Natasha, meus colegas me ovacionavam e eu achava que estava arrasando, com tempo descobri que meu talento pra comédia era mais latente do que pra ser uma estrela da música. Pelo menos eu conseguia divertir os meus colegas que dia após dia enquanto durou a novela pediam bis na hora do recreio. Enquanto eles desopilavam o fígado eu me perdia em devaneios sentindo-me a própria Natasha. Ah, tempos bons aqueles!!!

Com o fim da novela e de minha meteórica carreira durante os recreios escolares minha paixão pelos dentuços sedutores continuou com filmes como Drácula de Bram Stocker com um assustador e impecável Gary Oldmann e uma indefesa Wynonna Rydder, o delírio das adolescentes de 1994 Entrevista com o Vampiro, com o simpático Tom Cruise, o lindíssimo Brad Pitt e o maravilhoso-tudo de bom-caliente Antonio Banderas e A rainha dos Condenados com a graciosa e precocemente morta Alyiah.

Por fim chegamos em 2009 e a febre do momento é a saga baseada na série Crepúsculo do livro de Sthefenie Meyer. Assisti a Lua Nova essa semana e é redundante dizer que adorei, para um romântico incorrigível como eu a saga dos vampiros apaixonados é um prato cheio, mas não vou ficar aqui falando sobre tudo o que todo mundo já sabe um pouco devido ao grande sucesso dos livros e tal, apenas recomendo que assistam e deixem-se envolver por essa deliciosa magia que como os vampiros é eterna!!!

sábado, 21 de novembro de 2009

DA SÉRIE: OS FILMES DA MINHA VIDA - FILHOTE (1)

A partir de hoje inauguro aqui no blog uma série de postagens sobre os filmes que mais amei ao longo da vida. Serão reflexões profundas, comentários simples ou apenas dicas, o importante é que estarei escrevendo sobre uma das coisas que mais adoro: cinema. tenho certeza que quem é cinéfilo como eu vai se deliciar.
São filmes que assiste no cinema, em dvd ou simplesmente na tela quente, supercine ou sessão da tarde.
Vamos ao primeiro:


Este filme eu assisti em janeiro de 2006 no cine Guion Center no Nova Olaria em Porto Alegre.

Filhote é um drama espanhol lançado no Brasil em julho de 2005 com direção de Miguel Albaladejo. Gostei demais deste filme porque adoro um bom drama e este tem todos os ingredientes necessários para me agradar. Fala de amor, amizade e preconceito, temas que me fazem rir, chorar e refletir.

Filhote ou Cachorro - seu título original - é um filme modesto e despretencioso, tanto que ficou pouquíssimo tempo em cartaz e exclusivamente nas salas de cinema chamadas alternativas, muito provavelmente por sua temática gls. O que foi uma injustiça, porque Filhote é muito mais do que isso. Filhote é um lembrete aos mais distraídos de que o amor em sua forma mais pura é inabalável e transmuta o tempo e todos os seus obstáculos, não se compra, não se impõe, não se inventa, apenas se conquista e se cultiva com verdade e transparência.

Um pouco da história: Pedro é um dentista homossexual que vive na efervescente Madri - a cidade dos meus sonhos -, homossexual e solteiro ele tem uma intensa vida social, regada a muita festa e sexo até que sua única irmã, mãe do pequeno e doce Bernardo decide fazer uma viagem a Índia acompanhando o novo namorado hippie, o que implica em deixar o filho sob os cuidados do tio solteirão completamente despreparado para conviver com uma criança dentro da própria casa.

Pedro faz todos os ajustes necessários para receber o sobrinho. Diminui as festas e dá uma zerada temporária em sua vida afetiva/sexual. Tudo para proporcionar ao tímido menino um ambiente estável e acolhedor.

Num primeiro momento ambos ficam retraídos um com o outro sem saber muito como agir, mas com o passar dos dias os dois começam a se dar muito bem apesar da falta de jeito e intimidade de ambas as partes, até que Pedro recebe uma correspondência da irmã comunicando-o que está presa com o namorado na Índia por porte de drogas.

Pedro tem que readaptar toda sua vida para ficar com Bernardo por tempo indeterminado. Cria-se entre os dois uma relação extrema de amor e carinho até que lá pelas tantas aparece a avó paterna do garoto exigindo sua guarda, por achar inadmissível que o neto seja criado por um homossexual. A partir daí depois de muitas lágrimas e sofrimento o filme parte para um emocionante final.

domingo, 8 de novembro de 2009

O MUNDO NÃO É MATERNAL

por Martha Medeiros

É bom ter mãe quando se é criança, e também é bom quando se é adulto. Quando se é adolescente a gente pensa que viveria melhor sem ela, mas é erro de cálculo. Mãe é bom em qualquer idade. Sem ela, ficamos órfãos de tudo, já que o mundo lá fora não é nem um pouco maternal conosco.

O mundo não se importa se estamos desagasalhados e passando fome. Não liga se virarmos a noite na rua, não dá a mínima se estamos acompanhados por maus elementos. O mundo quer defender o seu, não o nosso.

O mundo quer que a gente fique horas no telefone, torrando dinheiro. Quer que a gente case logo e compre um apartamento que vai nos deixar endividados por vinte anos. O mundo quer que a gente ande na moda, que a gente troque de carro, que a gente tenha boa aparência e estoure o cartão de crédito. Mãe também quer que a gente tenha boa aparência, mas está mais preocupada com o nosso banho, com os nossos dentes e nossos ouvidos, com a nossa limpeza interna: não quer que a gente se drogue, que a gente fume, que a gente beba.

O mundo nos olha superficialmente. Não consegue enxergar através. Não detecta nossa tristeza, nosso queixo que treme, nosso abatimento. O mundo quer que sejamos lindos, sarados e vitoriosos para enfeitar ele próprio, como se fôssemos objetos de decoração do planeta. O mundo não tira nossa febre, não penteia nosso cabelo, não oferece um pedaço de bolo feito em casa.

O mundo quer nosso voto, mas não quer atender nossas necessidades. O mundo, quando não concorda com a gente, nos pune, nos rotula, nos exclui. O mundo não tem doçura, não tem paciência, não pára para nos ouvir. O mundo pergunta quantos elétrodomésticos temos em casa e qual é o nosso grau de instrução, mas não sabe nada dos nossos medos de infância, das nossas notas no colégio, de como foi duro arranjar o primeiro emprego. Para o mundo, quem menos corre, voa. Quem não se comunica se trumbica. Quem com ferro fere, com ferro será ferido. O mundo não quer saber de indivíduos, e sim de slogans e estatísticas.

Mãe é de outro mundo. É emocionalmente incorreta: exclusivista, parcial, metida, brigona, insistente, dramática, chega a ser até corruptível se oferecermos em troca alguma atenção. Sofre no lugar da gente, se preocupa com detalhes e tenta adivinhar todas as nossas vontades, enquanto que o mundo propriamente dito exige eficiência máxima, seleciona os mais bem-dotados e cobra caro pelo seu tempo. Mãe é de graça.

domingo, 1 de novembro de 2009

A SOLIDÃO, ESSE CASTIGO

Duas da tarde de um sábado modorrento, muitas nuvens no céu e uma chuva fina e persistente o deixava quase depressivo.

Na pequena quitinete de paredes muito claras, levantou-se da cama com os cabelos desgrenhados e a cara inchada de tanto dormir. Jogou-se no sofá branco, respirou fundo, coçou a cabeça umas cinco vezes e resolveu lavar o rosto.

Na pia do banheiro parou alguns segundos diante do espelho e comtemplou sua imagem profundamente. Analisou os olhos, a boca, os dentes, o nariz, o cabelo, a pele, as marcas de expressão começando a aparecer. Sentiu um leve incômodo. Mas o que queria encontrar ali, diante de seu reflexo no espelho, era respostas sobre quem ele havia se transformado, se aquela imagem o satisfazia em algum ponto, de alguma forma. Sorriu um riso desanimado de canto de boca, secou o rosto com a toalha verde-água de babado bordada com a frase "mamãe te ama" e voltou ao sofá branco. Ficou ali imóvel por alguns longos minutos pensativo à escutar o barulho incessante da chuva.

Quase três da tarde, sentiu fome, foi até a geladeira e preparou um sanduíche de peito de peru com alface e tomate e um copo de achocolatado, comeu rápido e foi verificar se havia algum recado ou coisa parecida. Mexeu no celular, nenhum recado, nenhuma ligação não atendida. Entrou na internet, checou os e-mails, nada de novo além de uma enxurrada de propagandas e "ofertas imperdíveis" de diversos produtos, ninguém no msn. Leu um pouco do último livro que havia comprado á uma semana, mas não se deteve na leitura por mais de 20 minutos, jogou o livro num canto, nada parecia interessante naquela tarde cinza.

Resolveu escutar música. Espalhou todos os cd's pelo chão, sentou em posição de lótus e começou a escolher minuciosamente, seus álbuns preferidos, entre eles: Marina Lima, Bruce Springsteen, Pretenders, Legião Urbana, The Cranberries e Adriana Calcanhoto.

Enquanto Bruce com sua voz rouca e melancólica inundava todo o espaço, sua memória era inundada por lembranças e seu coração de ternura. Ao som de Streets of Philadelphia lembrou da sessão de cinema com o pai quando assistiu ao filme com Tom Hanks e Denzel Washington aos 12 anos de idade. Apesar dos pesares, o pai era um ótimo companheiro de sessões cinematográficas. Das boas recordações que tinha dele, uma delas era o gosto pela sétima arte, cultivado nele desde muito pequeno quando era levado para assistir filmes dos Trapalhões e da Disney.

Abriu o guarda-roupa, pegou um pequeno baú de madeira, marrom, um álbum de fotografias e trocou Bruce Springsteen por Legião Urbana. Sabia que quando pegava seu pequeno baú e seu álbum de fotos começaria uma longa e melancólica sessão-nostalgia, então suspirou fundo. Pensou que naquele momento cairia muito bem um vinho e lembrou que em algum lugar daquela casa tinha uma garrafa guardada. Após um tempinho encontrou, ainda embrulhada em papel de presente com motivos natalinos a garrafa dentro do forno. Desembrulhou. Vinho branco suave. Era perfeito, adorava vinho branco suave. Encheu a taça e voltou ao seu baú de recordações, agora estava devidamente preparado para a longa jornada passado a dentro que faria, munido de um sábado chuvoso e solitário, uma saudade dolorida e uma taça de vinho ao som de Giz.

Do baú de recordações saíam pequenos objetos repletos de histórias e lembranças do passado, coisas sem nenhum valor material mas de imenso valor sentimental. Lembranças de momentos felizes, marcantes, guardados com o cuidado de um grande tesouro: a embalagem de um bombom; a pétala seca de uma rosa; um cartão postal enviado da Europa por uma amiga querida; bilhetes de cinema de alguns filmes inesquecíveis; um pequeno anel que deixou de servir; cartas; bilhetes; poemas; o frasco vazio de um perfume inebriante que deixou sensações profundas...

O baú de recordações, aliado ao álbum de fotos, acompanhados do vinho, da chuva e da solidão, fizeram-no chorar copiosamente. Aos soluços ouviu o toque da campanhia, disfarçou as lágrimas e atendeu a porta. Do outro lado, a vizinha da frente.

A moça pediu um sacarrolhas emprestado, pois estava recebendo uns amigos para uma noite de queijos e vinhos e seu sacarrolhas havia desaparecido misteriosamente.

Emprestou o sacarrolhas, a vizinha agradeceu e virou as costas.

Fechou a porta atrás de si e ficou encostado nela, parado, sem mover um músculo, sentindo-se a criatura mais solitária e infeliz do mundo. As lágrimas voltaram a rolar por seu rosto e agora Marina cantava "eu espero acontecimentos mas quando anoitece é festa no outro apartamento..."