domingo, 30 de setembro de 2012

OS QUASE-GAYS DE JOÃO EMANUEL CARNEIRO

João Emanuel Carneiro já pode ser considerado um dos melhores novelistas de sua geração. Com quatro novelas de grande sucesso no currículo, o autor arrebata os telespectadores a cada nova estória. São tramas dramáticas, recheadas de suspense e muito bem costuradas, que hipnotizam o público a cada capítulo sem cair na enrolação, a famosa "barriga" que quase toda a novela possui.

Além das tramas principais que são sempre envolventes, os demais núcleos sempre possuem narrativas charmosas e divertidas, com personagens bem delineados que seguram bem a estória tornando-a deliciosa como um todo. Eu, definitivamente, adoro João Emanuel e suas novelas, desde DA COR DO PECADO em 2004 até a atual AVENIDA BRASIL de 2012.

Como nem tudo é perfeito, algo me incomoda profundamente nas novelas de João Emanuel Carneiro. Era algo que até então eu não tinha parado pra pensar, mas fazendo um retrospecto de suas 4 tramas exibidas pela Rede Globo: DA COR DO PECADO, COBRAS E LAGARTOS, A FAVORITA e AVENIDA BRASIL, percebi que todas tem um personagem quase-gay, ou seja, aquele sujeito que tem tudo pra ser, demonstra tendências, ilude o telespectador, mas no final das contas é heterossexual ou quase isso.

Em DA COR DO PECADO (2004) temos Abelardo, rapaz sensível e delicado, criado numa família de lutadores, com quatro irmãos machões, que tem aversão pelas artes marciais e sonha em ser maquiador. Em interpretação luminosa de Caio Blat, pra mim o melhor personagem de sua carreira e o meu preferido quase-gay de todos, Abelardo foge como o diabo da cruz de Tina (Karina Bacchi), maria-tatame que já ficou com todos os seus irmãos. Pra completar, em determinado momento da trama Abelardo encontra um companheiro, Íris, um rapaz que tem as mesmas afinidades e juntos os dois competem em um concurso que vai eleger um maquiador para Madonna. Embora a sexualidade de Abelardo fosse questionada a todo momento pelos familiares por causa de suas tendências artísticas, nunca foi mencionado pelo próprio uma preferência pelo mesmo sexo, deixando sempre no ar uma dúvida, mas tudo nele era tão gay que os telespectadores tinham certeza. Só que no fim das contas Abelardo revela-se hetero, ficando com Tina e assumindo a paternidade de seus filhos juntamente com os irmãos Dionísio (Pedro Necshlling) e Thor (Cauã Reymond).

Na novela seguinte, COBRAS E LAGARTOS (2006), o autor nos apresenta Tomás (Leonardo Miggiorin), logo de cara rotulado como metrossexual. Se para o público ficava evidente logo de início que Tomás não era gay, para os personagens da trama não. Justamente por ser extremamente vaidoso, usando sempre cremes pra pele, fazendo tratamentos para o cabelo e abusando de roupas justas, coloridas e exóticas, Tomás era vítima de piadinhas e insinuações, até começar um namoro com a estilista Sandrinha (Maria Maya), com quem formou uma hilária dobradinha. Embora ficasse explícita a preferência sexual de Tomás, minha pergunta é: por que essa fixação de João Emanuel pela dubiedade sexual em seus personagens? Mas não termina por aí...

Em 2008, JEC nos brinda com sua primeira novela no horário nobre, a inovadora e sensacional A FAVORITA. Tudo perfeito, até o personagem Orlandinho de Iran Malfitano, esse sim gay de verdade, loucamente apaixonado por Halley (Cauã Reymond), casar-se com Maria do Céu (Deborah Secco) e após relutar de todas as formas, render-se a uma paixão heterosexual pela então esposa de fachada. Vergonha das vergonhas transformar um personagem gay em hetero sabe-se lá por que cargas d'água. Como se na vida real fosse assim: hoje sou gay, amanhã sou hetero. Sentimento de revolta por ter amado tanto uma novela que me fez de idiota com um personagem quase-gay.

Por fim chegamos ao grande sucesso do momento, a cinematográfica AVENIDA BRASIL (2012), onde temos Roni (Daniel Rocha), Roniquito pros mais íntimos. Jogador
de futebol, Roni não assume sua sexualidade, porém percebe-se envolvido por
Leandro (Thiago Martins) e tem ojeriza a Suellen (Ísis Vaverde), maria-chuteira que já passou pela cama de todos os boleiros do bairro. O problema é que Leandro é louco por Suellen e por ironia do destino Roni acaba se casando com ela e indo pra cama também. Neste momento da novela, os dois já estão separados e Suellen investe em Leandro, que começa a ganhar dinheiro com o futebol. Roni curte uma dor de cotovelo, mas até agora nada de se assumir. Resta esperar mais algumas semanas pra saber o desfecho desse triângulo e descobrir se teremos afinal mais um quase-gay em mais uma trama de João Emanuel Carneiro. Porque tendo em vista que o autor me parece ele mesmo ser gay na vida real, essa fixação por retroceder a homossexualidade de seus personagens demonstra uma não-aceitação inconsciente de sua própria sexualidade. 

Aguardemos as cenas dos próximos capítulos...

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

UM LUGAR CHAMADO XINGÓ


Se a felicidade são apenas momentos de alegria, nesse lugar inóspito e histórico, situado entre o interior de Sergipe e Alagoas, eu fui intensamente feliz por três breves dias. Foram dias de sonho. 

Xingó. Esse lugar, embora quase deserto e tão distante, me proporcionou momentos inesquecíveis. Tão inesquecíveis que até hoje, mais de 15 anos depois, as lembranças continuam vívidas e frescas na minha nostálgica memória.

Foi um tempo de ternura. Éramos jovens, cheios de vida, vigor, esperança e ilusões. Cheios de amor. Ríamos de qualquer coisa, fazíamos piada de tudo, nada nos escapava. Tudo era motivo pra festa. A felicidade sempre estampada em nossos rostos lisos e cheios de viço.

Foi ali em Xingó que os laços se fortaleceram e a intimidade se intensificou. Com Diana, Suzana, Edvan, Alexandre, Pablo, Cléber, Deives, Daniela e Samuel meu mundo era completo. Cada um a seu modo era muito especial. Edvan era o palhaço da turma, as vezes com apenas uma expressão arrancava gargalhadas de tirar o fôlego. Diana e Suzana eram as irmãs que sempre tinham uma palavra amiga quando alguém precisava. Sensatas, carinhosas, equilibradas, eram as conselheiras do grupo. Era no colo delas que todo mundo ia chorar as mágoas quando algum problema afligia. Alexandre era o culto, com ele dividi deliciosos momentos de música e poesia. Pablo era o desencanado. Cléber, o tenso. Deives, o responsável. Daniela era nossa dançarina, hiperativa e dona de um sorriso sempre escancarado e Samuel, uma utopia romântica. O primeiro amor platônico, impossível e não correspondido.

Juntos em Xingó, nunca fomos tão felizes ao som de Legião Urbana em "Somos tão jovens": todos os dias quando acordo, não tenho mais o tempo que passou...
 

sábado, 1 de setembro de 2012

O PRÍNCIPE DAS MARÉS?


Era feriado, um feriado qualquer. A noite estava agradável, convidativa. Saiu em direção a praia, queria caminhar a beira-mar. Precisava pensar na vida. Andava aflito, reflexivo, cheio de preocupações. Estava bem vestido, perfumado. Sempre que fazia seus passeios noturnos, tinha o desejo ilusório de encontrar alguém pelo caminho, alguém especial. Para apenas uma noite ou algo permanente, a ilusão sempre presente.

Percorreu o calçadão. Contemplou os jardins. Viu pessoas bebendo, rindo, abraçando e se beijando nos quiosques. Crianças andando de bicicleta. Gente passeando com seus cães. Adolescentes se agarrando. Sentou-se num banco em frente ao reduto onde rapazes se exercitavam. Observava os belos corpos movimentando-se. Uns saíam, outros chegavam, mas um permanecia.

Naquela noite solitária, estava especialmente melancólico. Os rapazes lindos e musculosos, chamavam sua atenção, mas não a prendia. A cabeça estava longe, um tanto quanto atormentada. A lua estava cheia, branca e brilhante, olhava pra ela e com o coração apertado, pedia que lhe trouxesse algo bom. Admirava o reflexo de sua luz no mar e se sentia bem.

Quando tornou a olhar os rapazes, percebeu que todos já tinham partido, exceto um. Aquele que estava lá, desde que sentou-se no banco, e não saiu, não parou em nenhum momento de exercitar-se. Não conseguia acreditar, mas tinha a impressão de que o rapaz o olhava e sorria pra ele. Era muito bonito e tudo parecia surreal, achou que estava delirando. Via-se extremamente comum, quase sem graça, incapaz de atrair alguém tão atraente.

Teve certeza de que era o alvo do belo rapaz quando este se aproximou e puxou assunto. Seu nome era Carlos. Ficou nervoso com a aproximação, sem jeito. O corpo, o charme e o sex appeal de Carlos o perturbava. Achava que pessoas como ele gostavam só de pessoas que fossem seu próprio reflexo. 

Inseguro, falou pouco, mediu as palavras, respondia só o que Carlos lhe perguntava. Então veio o convite para que corressem na areia, sem rumo. Diante do rapaz de bermuda e sem camisa, alegou que não estava vestido apropriadamente pra correr com calça jeans e camisa. Mudou a proposta então, para uma simples caminhada. Ele topou na hora, um deus grego como aquele convidando-o pra caminharem juntos à beira-mar, era mais do que ele havia pedido pra lua. 

Então caminharam e conversaram, falaram sobre exercícios físicos, que era o assunto preferido de Carlos e falaram sobre o desejo de se beijarem e passarem aquela noite juntos, mas de repente Carlos cansou de caminhar e resolveu correr. Insistiu mais uma vez com ele que corresse junto, a seu lado, que ia lhe fazer bem, mas ele não quis, estava com preguiça de correr. Prometendo que correria alguns metros e voltaria para reencontrá-lo, Carlos se foi.

Sentia-se presenteado pelos céus ao ver aquele homem atlético, forte e cheio de músculos correndo pela praia, deixando a promessa de que logo voltaria pra lhe proporcionar uma noite cheia de prazer e delícias. Mas, ao ver Carlos desaparecer na escuridão, sem nenhum sinal de volta, seu semblante começou a desvanecer. Andou mais depressa pra ver se o enxergava ao longe, mas não viu mais nada, parecia ter desaparecido como fumaça, como se a escuridão o tivesse tragado.

Ficou parado, incrédulo, olhando pra todos os lados. Algum sinal daquele homem fabuloso tinha que aparecer. Inconformado pensou, como pôde ser tão burro em acreditar que um homem daqueles ia querer algo com ele ou tão tolo de não tê-lo seguido, corrido ao seu lado como ele queria? De qualquer modo estava acabado, aquele breve sonho havia chegado ao fim. O resto eram só conjecturas. Seja o que tivesse sido aquilo, Carlos seria pra sempre o seu "príncipe das marés".