sábado, 2 de outubro de 2010

SOUFLÊ DE QUEIJO

por Luís Fernando Veríssimo


Jorge conta a Marta que convidou seu novo chefe para jantar.

- Eu falei do meu souflê de queijo e ele se interessou.

- Você falou no seu souflê de queijo assim, sem mais nem menos?

- Não. Não lembro qual era o assunto. Nós estávamos numa reunião e, de repente se falou em souflês.

- Que estranho, não é uma firma de corretagem? Vocês falam muito em souflês nas reuniões?

- Não interessa. O fato é que ele vem jantar aqui. Aceitou na hora.

- Quando?

- Amanhã.

Na noite seguinte:

- Você vai usar esse vestido?

- Por quê?

- Usa aquele teu preto, o decotado.

- Ó, Jorge! Quié isso?

- Você fica muito bem naquele vestido, e eu quero que ele veja como a minha mulher é bonita.

- Você quer que ele veja os meus peitos, é isso?

- Não, Marta. É pra, sei lá. Combinar com o jantar. Com as velas, com o souflê...

- Este vestido está bom.

- Marta. Por favor.

- Não sei que diferença vão fazer os meus peitos.

Jorge, depois de um suspiro de impaciência:

- Marta, acho que você não se deu conta da importância desse jantar. Pra mim. Pra nós. Ele é o novo chefe. Está num período de avaliação da equipe. Tem gente que vai pra rua. Ele é quem decide. Está entendendo? Eu posso ir pra rua.

- Se ele não gostar do seu souflê?

- Não, Marta! Mas ele aceitar vir provar meu souflê é um sinal de que quer me conhecer melhor. Podemos ficar amigos. Esse jantar pode decidir a nossa vida, Marta. Preciso que você faça a sua parte.

- Mostrando os peitos...

- E não só isso.

- Não só isso, Jorge?!

- Marta, chegou a hora de saber o que você está disposta a fazer por mim. Pela minha carreira. Pelo nosso futuro. Por nós.

- Como assim?

- Você sabe que eu tenho que ficar na cozinha quando o souflê estiver ficando quase pronto. Os últimos minutos são cruciais para um souflê de queijo não passar do ponto. E você vai ficar sozinha com ele na sala. Marta...

- Jorge, você é que está passando do ponto.

- Marta, isso não é hora de pensar em fidelidade, em moral, em mais nada. É hora de pensar no meu emprego e na nossa renda. É hora de você pensar nas prestações do seu cartão de crédito, Marta!

- Mas...

- Vá botar o vestido decotado!

Chega o novo chefe para jantar.

- Marta, este é o Ciro. Ciro, esta é a Marta, minha mulher.

É evidente a surpresa na cara de Ciro

- Sua mulher?

- É.

- Eu não sabia que você era casado.

- Sou, sou. E bem casado.

- Prazer - diz Ciro, estendendo uma mão lânguida para Marta apertar. A decepção substituiu a surpresa no seu rosto.

Mais tarde, na cozinha, onde entrou para buscar o gelo, Marta comenta com Jorge, que acaba de colocar o souflê no forno:

- Acho que ele está a fim é de você, Jorge.

- Nem brincando, Marta.

- Chegou a hora de saber o que você está disposto a fazer pela sua carreira. Pelo nosso futuro. Por nós, Jorge.