quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

DA SÉRIE: OS FILMES DA MINHA VIDA - TRÊS FORMAS DE AMAR (4)



A descoberta da sexualidade é sempre uma fase bastante marcante na vida de qualquer um, e quando essa descoberta vem acompanhada de uma história que explora muito mais do que o convencional papai-mamãe/homem-mulher, de maneira sensível, divertida e leve, expondo de forma verdadeira e franca o ser-humano e todas as suas possibilidades de amor, tudo se torna mais fácil ou menos conflitante.


O filme TRÊS FORMAS DE AMAR faz parte da minha vida exatamente por isso. Lançado em 1994, ele conta a insólita história de Alex, Stuart e Eddy. Alex é uma garota, que justamente por causa de seu nome unissex acaba vítima de um erro burocrático, tendo que dividir com os rapazes Stuart e Eddy o mesmo módulo em um alojamento universitário. A princípio Alex fica furiosa com o engano e tenta consertá-lo o mais rápido possível, mas não obtém sucesso. No decorrer da história as personalidades de cada um dos três vai se delineando e com a convivência cria-se um forte vínculo entre eles.


Alex é a garota descolada e moderna que segue todos os seus instintos e só faz o que tem vontade, Stuart é o cara que só pensa em sexo e se acha o macho mais gostoso e irresistível de todos e Eddy é o rapaz tímido e sensível, confuso em sua sexualidade, até conhecer seus novos colegas. Apesar da bonita amizade que surge entre eles, paira sempre no ar um clima de desejo erótico, entre toques, piadinhas e brincadeiras o triângulo se define da seguinte forma: Stuart desde o primeiro momento deseja Alex, que por sua vez se encanta pelo jeito doce e sensível de Eddy, que não demora a perceber-se completamente envolvido por Stuart.


Estabelece-se entre os três uma espécie de jogo para ver quem consegue levar quem pra cama primeiro. Depois de muitas tentativas, conflitos e discussões o triângulo culmina num belíssimo e excitante ménage à trois. Mas como tudo na vida tem consequências, eles têm de arcar com as suas após renderem-se as três formas de amar.


Tinha 14 anos quando vi esse filme em 1995 e marcou demais pela identificação com o personagem Eddy, vivido por Josh Charles. Pela primeira vez num filme um personagem vivia conflitos parecidos com os meus, mas não só por isso, o filme mostra cenas lindas como a do rio, em que eles tomam banho nus e trocam o primeiro beijo triplo. Os atores estavam no auge de seu frescor e vigor juvenil, e se entregaram de corpo e alma aos personagens, passando muita verdade. Esse é um detalhe interessante, o elenco: Lara Flynn Boyle (Alex), Stephen Baldwin (Stuart) e Josh Charles (Eddy) desapareceram de Hollywood. Sabe-se pouco sobre eles, com excessão de Stephen, que faz parte da famosa família Baldwin e atualmente é pastor de uma igreja. Provavelmente desistiu da carreira e está ganhando muito mais grana angariando fiéis pra sua igreja. Lara foi casada com Jack Nicholson e participou ultimamente de algums séries de televisão como ALLY McBEAL e Josh também participa esporádicamente de algumas séries televisivas sem grandes destaques. O que me leva a crer que TRÊS FORMAS DE AMAR também pode ter sido o filme da vida deles.




o beijo no rio

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

O VOO DA ÁGUIA




Naquela manhã, Nina acordou no horário de sempre. Às 09:30 em ponto, abriu os olhos, e sabia que seu dia seria a mesma repetição de todos os dias anteriores dos últimos dois anos. Mas naquele dia, Nina estava especialmente esgotada, não queria levantar, escovar os dentes, tomar uma xícara de café preto, vestir a roupa, sair de casa, pegar o ônibus, chegar até o restaurante em que trabalhava, trocar a roupa pelo uniforme e servir das 11:00 até à meia-noite os mesmos clientes chatos e exigentes de sempre. Era sexta-feira e ela queria fazer algo diferente, já tinha perdido as contas de quanto tempo não tirava folga numa sexta-feira, nem num sábado, nem num domingo, ao contrário da maioria, para Nina fim de semana era sinônimo de trabalho dobrado. Apenas uma folga no meio da semana e um domingo de dois em dois meses, esse era o trato que havia feito com os patrões assim que chegou do interior desesperada por um emprego, a fim de concretizar todos os seus sonhos na cidade grande. Aceitou sem pestanejar a proposta, pois estava certa de que conseguiria com o tempo ganhar a simpatia e compreensão dos patrões e conciliar o trabalho com um cursinho pré-vestibular ou um curso de idiomas, estando dentro de alguns meses apta a conseguir um emprego menos sacrificante. Mas não foi o que aconteceu, quanto mais o tempo passava Nina se afundava no trabalho e mal conseguia tempo para respirar, era de casa pro trabalho, do trabalho pra casa e nada mais.


Encontro com amigos, sessões de cinema, teatro, baladas, viagens em finais de semana e feriados, nada disso fazia mais parte da vida de Nina. Encontrava até dificuldade para visitar a mãe viúva e sozinha, que tinha ficado na pequena cidade onde se criou. O dinheiro também era pouco, mal dava para pagar o aluguel do minúsculo quarto e sala em que morava, mandar algum pra mãe e guardar o restante para pagar os estudos assim que conseguisse encontrar tempo. Às vezes pensava em chutar o pau da barraca e pedir demissão do emprego, respirar um pouco, passear, usufruir todos os prazeres que uma grande metrópole pode oferecer e que ela desejava tanto, afinal não tinha mais vida própria, sentia-se uma escrava, enclausurada entre as quatro paredes daquele bendito restaurante. Mas quando vinha a vontade de jogar tudo pro alto, pensava na dificuldade de se conseguir um emprego e repetia para si mesma que precisava ser mais paciente e que as coisas iriam melhorar. Era bonita, inteligente, razoavelmente culta, tinha capacidade de conseguir algo melhor, ainda que sem um diploma nas mãos. Iria ser paciente e sair de seu emprego só depois de conquistar uma oportunidade melhor, não jogaria fora tanto trabalho duro para ficar de mãos abanando. Sim, seria paciente, suportaria por mais um tempo, aquele trabalho que sugava todas as suas energias.

Seis meses, um ano, um ano e meio, dois anos se passaram e nada melhorou. Nina levantou-se e ficou sentada na beira da cama, ligou o rádio, coisa que sempre fazia, pois adorava acordar com música. Respirou fundo, a ideia de enfrentar mais um dia como garçonete no restaurante parecia sufocar-lhe. Pensou que não suportaria, que já havia chegado em seu limite. Sentiu vontade de chorar, não queria ficar desempregada e ser obrigada a voltar pra sua cidade com o "rabo entre as pernas", como uma fracassada, que saiu da casa da mãe prometendo ganhar o mundo, conquistar sua independência e "deu com os burros n'água". Era assim que aquela gente fofoqueira ia falar, pois o passatempo preferido deles era falar da vida alheia. Não queria mais voltar, viver aquela vidinha medíocre de cidade provinciana novamente, não tolerava mais cidade pequena. Estava num impasse, o que era mais intolerável, continuar em seu abusivo emprego que exauria todas as sua forças para batalhar por algo melhor ou retornar como um fracasso total a casa de sua solitária mãe, que com certeza receberia-a de braços abertos, mas tendo que aguentar a maldade alheia dos moradores de sua minúscula cidade fazendo comentários e especulações nada agradáveis a seu respeito? Nina deu de ombros, de repente todo seu corpo amoleceu, pensar em todas aquelas possibilidades havia deixado-a tensa. Mesmo sentindo-se violentada, decidiu aprontar-se para mais um dia de trabalho.

Com a xícara de café na mão e já pronta para o trabalho, Nina aumentou o volume do rádio para escutar a mensagem do dia que sempre ouvia antes de sair. Eram sempre mensagens de ânimo, conforto, que falavam de amor, paz, esperança e faziam seu dia ficar mais leve, muitas vezes lhe dando uma injeção de ânimo pra segurar alguma barra. E justamente naquele dia ela precisava de algo especial, estava torcendo pra que as palavras do locutor lhe enchessem de força pra continuar, pra suportar quanto mais fosse necessário.

O locutor com sua voz firme e suave começou a falar sobre a águia. Neste conto uma águia pode viver até 75 anos, no entanto quando chega aos 40 ela já está velha demais para continuar voando, caçando e experimentando a liberdade como antes. Seu bico alongado e pontiagudo se curva apontando contra o peito, dificultando assim que se alimente, suas garras também já bastante frágeis impede que ela agarre sua comida e as penas já muito velhas e gastas não suportam mais grandes voos. Diante de tal quadro a águia tem apenas duas opções: a primeira é entrar num processo de auto-mutilação durante 150 dias, onde vai arrancar com o bico suas unhas e as penas e arrancar seu bico nas pedras, para que nasçam novos bico, unhas e penas e ela possa viver mais 35 anos como uma jovem ave. Como todo esse processo é muito doloroso e cansativo a segunda opção é ficar parada num canto qualquer até a morte, já que viver completamente debilitada, sem poder voar e se alimentar é impossível. A águia desta historinha escolhe a primeira opção, afasta-se para um lugar ermo e distante, começando assim seu processo de auto-mutilação, sofre com as dores, sangra, grita, mas depois de 150 dias está novamente bela e elegante, pronta para seu voo de renovação.

Ao término da mensagem Nina chorou copiosamente, mas não era um choro de tristeza, era um choro limpo, puro, um choro de renovação, porque naquele momento ela tinha decidido, assim como a águia do conto não ia ficar parada, impotente, esperando todas as suas energias serem sugadas até que não lhe restasse mais nem um sopro. Sabia que pagaria um preço alto por sua decisão, mas estava disposta a pagar. Nina queria continuar vivendo e voando.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

PEQUENO MONSTRO - PARTE FINAL

Última parte da crônica de Caio Fernando Abreu:





- Tu não quer convidar o Alex pra dar uma volta na praça e tomar um choppe no centro?
- Ficaram os três me olhando. Passei o dedo na calda do pêssego, e lambi bem devagar quando olhei pro primo Alex e convidei:
-Vamos?
Ele susteneou o olhar e disse que sim.


Azul, mas não era bem bem azul. Isso eu só vi na metade da primeira cerveja. Azul-escuro que clareava aos poucos, meio esbranquiçada nas partes em que encostava no corpo. Nos joelhos, na bunda, na frente onde roçava no volume do pau, atrás do fecho. Tinha fecho ecler que nem saia de mulher, em vez de botão igula a minha. Já tinha visto umas assim, mas em filmes de mocinho, e só umas poucas nuns caras meio metidos ali na praia mesmo. Dava um jeito especial na pessoa. Um jeito bonito, um jeito moderno. Eu não tinha falado quase nada, mas depois daquele gole de cerveja, tomei coragem e disse:
- Bacana a tua calça.
- É Lee - ele disse - Americana, importada.
- Onde a gente compra?
- Só de contrabando. Quer que te consiga uma?
Perguntei se era difícil. Ele disse que tinha jeito, conhecia um faixa em Porto Alegre. Depois falou que novinha não era tão legal, mas a gente podia desbotar com água sanitária no tanque. Melhor desbotar sozinha mesmo, só que levava tempo. Perguntei se a dele era desbotada de água sanitária ou de tempo. Ele estava distraído, não ouviu. Tirou o maço de Minister do bolso, perguntou se eu queria um. Falei que não, se o pai soubesse. Ele acendeu, jogou a fumaça pra cima, erguendo um pouco a cabeça. De novo, eu pensei no leão de ouro. Acho que eu estava ficando meio borracho com aquela cervaja toda, porque de repente fiquei de novo olhando sem conseguir parar o primo Alex sentado ali ao meu lado na mesinha da calçada do bar. Ele parecia enorme, ele parecia brilhante, ele parecia bonito. Sem fazer nenhum esforço pra parecer nada, ele não era exibido. Acho que ele nem sabia direito o jeito que ele era mesmo. Ficava ali sentado do meu lado como se fosse um cara comum, fumando, bebendo cerveja e rindo de vez em quando pra mim. Achei que todo mundo que passava, e nas outras mesas, ficava olhando pra ele e pensando: mas quem será esse moço? De repente me deu assim como uma vaidade daquelas pessoas todas estarem me vendo ali, ao lado dele, e aí aconteceu uma coisa maluca. Por um segundo parei de me sentir monstro.


Olhei para o meu braço na mesa. Meu braço um pouco fino demais, moreno de sol, mas parecia bonito também. Eu olhei a minha mão morena, quase sem pêlos, depois levei ela até o cabelo e pensei que podia deixar ele crescer um pouco, que nem o do primo Alex. E quando levei a mão desse jeito na cabeça, percebi que as minhas costas estavam muito curvadas para frente, como se eu quisesse sempre esconder do mundo alguma funda escondida no meu peito. Então forcei os ombros para trás, e não estava me sentindo nem um pouco monstro quando olhei de novo para o primo Alex e vi a lua cheia subindo por trás da cabeça dele e do telhado da taberna do Willy. O garçom chamou ele de senhor quando perguntou se queria outra cerveja. Ele tinha um jeito de quem sabe sentar num bar, aquele jeito que eu ia ter um dia. Ele perguntou se eu também queria, eu disse que sim, apesar de estar meio borracho. Ele encheu o meu copo até transbordar. Enquanto eu passavo o dedo na espuma, ele falou assim:

- A tia me contou que anda preocupada contigo. - Eu pensei: que saco, ela já andou enchendo os ouvidos dele. Agora vai ficar dando opinião, conselho e tudo. Mas ele não deixou eu dizer nada. Só falou: - Ela diz que acha que tu anda muito sozinho. Que tu não tem nenhum amigo.

Foi o que bastou. Quando ele falou isso - como num shazam! ao contrário, que ao invés do cara virar super, ficava ainda mais coió - eu comecei a me sentir monstro de novo. Coitado, coitado, coitado de mim, pensei. O meu olho ficou cheio de lágrima de pura pena de mim mesmo, todo troncho. Estava meio enjoado daquela cervajada toda, tive vontade de me levantar e dizer que ia embora já pra casa. Aí o primo Alex disse: - Eu sou teu amigo.

Parei outra vez de me sentir monstro. Nunca ninguém tinha me dito isso antes. Foi aí que as coisas começaram a acontecer muito depressa. Me deu vontade de rir, comecei a falar sem parar, ele começou a falar sem parar também no curso dele de medicina, nas coisas todas que ia estudar, umas coisas das cabeças das pessoas, de nome complicado, psico não sei o que, nuns livros duns caras de nomes complicados também, duns discos, duns filmes e disse que ia me dar umas coisas pra mim ler, pra mim ouvir, pra mim gostar. E eu fiquei pensando que não ia dar, porque eu ficava o ano todo lá naquele cafundó do Passo da Guanxuma e ele em Porto Alegre, e perigava então, até a gente não se ver nunca mais, e comecei a ficar triste. Aí ele contou, que a mãe tinha falado, que andava pensando em me mandar estudar em Porto Alegre. E primeiro me deu um baita cagaço, depois foi me vindo uma coragem boa e uma alegria no coração, ia ser que nem filme andar de bonde do centro até o tal Partenon, onde ele falou que morava, e eu ia lá todo domingo de tardezinha, ficava no quarto dele ouvindo na eletrola todos aqueles discos que ele falou que ia me mostrar. Eu com a minha calça Lee igualzinha a dele, no começo desbotada de água sanitária mesmo, depois do tempo, do sol, da chuva, e todo mundo olhava quando a gente entrava junto no cinema e falavam baixinho de um jeito diferente. Porque eu não era mais monstro, só porque a gente era bonito junto. Só por isso falavam e apontavam, eu e o primo Alex. Caminhando de tardezinha por uma praça ou uma calçada mesmo ali daquele lugar onde eu nunca tinha ido chamado Partenon. E Partenon era quase tão bonito e longe quanto Sumatra, Zanzibar, Uganda... E eu criei coragem e falei pra ele que queria ser músico, fazer rock que nem o do Elvis, que eu sabia de cor uns pedacinhos dumas músicas em inglês mesmo, e ele cantou rindo It's now or never, só um pedaço. Depois passou a mão no meu cabelo e disse que eu tinha que deixar um topete crescer pra cair na testa quando eu fizesse yeah remexendo as cadeiras, e só de sarro eu fiz yeah yeah yeah, e ele morreu de rir e eu morri de rir também. E ele pediu outra cerveja e eu acendi um cigarro e tossi, tossi e ele bateu nas minhas costas. As pessoas em volta olhavam, e ele começou a contar que depois de formado ia viajar de navio pelo mundo inteiro, e eu perguntei se Zanzibar também e ele morreu de rir de novo e disse que sim. Se eu queria ir junto com ele pra Zanzibar, lógico, eu disse, e fiquei imaginando tudo enquanto ele contava que ia ser um grande médico desses modernos que curam a cabeça dos outros pra deixar todo mundo feliz o tempo todo pra sempre sem nenhuma culpa, ele disse. Ele era tão bonito. Todo mundo em volta olhava, eu ria, ele ria, e a gente estava ficando cada vez mais bêbado, quando eu tentei levantar pra ir ao banheiro e quase caí em cima da mesa. Então ele me segurou peo braço, e rindo sem parar falou que tava na hora de ir embora, se não o pai e mãe iam ficar umas feras.

A gente só parou de rir no caminho da porta de casa até o quarto, pro pai e a mãe não acordarem. Passado de meia-noite, Alex viu no pulso. Ele acendeu a luz, se jogou na cama e continuou rindo. Eu fechei a porta, me joguei na cama e continuei rindo. Vezenquando a gente olhava um pro outro e ria mais ainda. Um tempão assim, feito dois mangolões. A barriga doía de tanto rir, eu falei que ia no banheiro mijar e já voltava. Demorei um pouco, parecia que tinha bebido um açude inteiro. Quando voltei, ele tinha tirado toda a roupa e estava deitado de costas na cama. Tu vai te gripar, pensei em dizer. Só pensei, em seguida vi que não tinha vento nem nada. E fui andando pra minha cama enquanto olhava pra calça Lee, a camisa banlon, o mocassim e a cueca dele, jogados no chão, sem saber direito o que fazer com a janela aberta, a lua cheia e o primo Alex completamente pelado na cama ao lado. Tentei não olhar pra ele, mas ele olhava bem pra mim quando falou estranho, como se o que quisesse dizer não fosse o que estava dizendo:
- Tá muito quente, tu não acha?
- É - Eu disse. E aí não consegui parar de olhar pra ele. Fui ficando meio descarado, e comecei a olhar mesmo, porque tinha vontade e era bom de olhar. Desci os olhos pelo peito dele, acompanhando aqueles pêlos que se amontoavam lá em cima, pouco embaixo do pescoço, em volta das mamiquinhas cor-de-rosa. Depois se estreitavam enquanto desciam pela barriga e ficavam assim um fiozinho crespo, até começarem a encrespar mais e a aumentar de novo no meio das pernas. Ele estava com as mãos no meio das pernas, lá onde os pêlos encrespavam mais.
- Eu te espiei dormindo hoje de tarde - contei.
- Eu vi - ele disse. - Eu não estava dormindo, eu estava batendo punheta.
Me deu um vermelhão. Desviei os olhos para o livro de Tarzan, o Invencível, na cabeceira. Em cima duma árvore, Tarzan apontava uma flecha para um bwana, falando com dois negros pigmeus na frente de uma barraca. E se ele disparar a flecha? pensei.
- Tu já esporrou? - ele perguntou.
- Não - eu disse - Nunca, nem sei como é que se faz.
-Quer que eu te ensine? - Estava rindo outra vez. Aquela cabeça de leão de ouro, dentes muito brancos.
- Quero - eu disse.

Ele tirou a mão do meio das pernas, bateu na cama ao lado dele e chamou:
- Senta aqui, eu te mostro como é. Tira a roupa e senta do meu lado.
Tirei, joguei no chão, em cima da roupa dele. Depois sentei na cama dele, só de cueca. Uma cueca feia, toda esbragalada, não era que nem a dele. Ele suava um pouco, o cheiro de suor misturava com o de um perfume que acho que era colônia de barba, mais o do jasmineiro entrando pela janela aberta. Eu podia ouvir o tum-tum do meu coração no peito. Ele estava bem perto de mim. Eu cruzei as pernas, de costas para ele, de frente para a janela.
- Vira pra cá - ele pediu.
Estendeu a mão, tocou no meu joelho. Fui virando, até ficar de frente pra ele. Ele sentou na cama, ficou de frente pra mim, cruzou as pernas também. Ele encostou uma das mãos na minha coxa, depois foi subindo e puxou devagarinho a minha cueca. Estendi a perna para que ele pudesse tirar e jogar no chão, em cima das roupas dele e das minhas. Agora eu também estava completamente nu. De pau tão duro quanto o dele, eu tinha visto. Ele não escondia, não era feio. Quase fiquei com vergonha, mas ele segurava os olhos dele bem dentro dos meus, sem sorrir, nem piscar. Ele levou a mão direita até o seu pau duro, enquanto com a mão esquerda pegava a minha mão direita e levava até o meu pau duro. Ele segurou meu braço, mexendo devagar para que eu movimentasse para cima e para baixo, que nem ele fazia. Ele era tão bonito. Ele se torceu e gemeu um pouco. Fechei os olhos: se sair reto daqui sempre em frente vou dar na África, pensei idiota. Aquela coisa querendo explodir vinha subindo de novo. Eu abri mais as pernas, joguei o corpo para a frente, ele chegou mais perto. Então pegou outra vez no meu braço, cuspiu na palma da mão e levou até o pau dele. Ele cuspiu na palma da mão dele e levou até o meu pau. Quente, molhado, rijo, macio. A cama rangia, eu cheguei ainda mais perto. Aquela coisa crescia dentro de mim feito louca de atar, como se o meu corpo fosse arrebentar e de dentro dele saísse balões, bandeirinhas coloridas de Santo Antonio, penduricalhos dourados de árvore de natal, confete e serpentina de carnaval, sei lá que mais. Mais depressa, ele disse. Mais depressa, vem junto. Parecia que a gente tava sozinhos só os dois num barco solto no mar no meio duma tempestade. Sumatra, Tantor Bukula, Nikima. Eu ia gritar alto quando aquela coisa começou a se juntar dentro de mim, feito uma onda que vai se armando lenge da praia, enquanto a gente espera que ela venha ali na beira, sem me importar nem um pouco que o pai e a mãe ouvissem, e a vizinhança toda e a cidade inteira acordassem. Ele chegou ainda mais perto, eu colei meu peito no peito dele. Ele afundou a boca na minha enquanto eu sentia a palma da minha mão aos poucos ficar molhada daquele fio de prata brilhante, que saía de dentro dele e sabia que de dentro de mim saía també um fio de prata molhado, brilhante, igual ao que saía de dentro dele.

-Vem comigo - ele chamou e eu fui.
Ele passou as mãos molhadas nas minha costas. Eu passei as mãos molhadas nas costas dele. Ele afastou a boca da minha, depois deitou a cabeça no meu ombro. Meu coração batia, batia, ele podia ouvir. O suor da gente se misturava. O coração dele batia, batia, escutei quando deitei a cabeça no seu ombro. Eu fiquei passando as mãos nas costas dele. Elas ficaram todas meladas da água de prata que ele tinha me ensinado a tirar de dentro de mim. Eu também não me importava de ficar melado da água dele. Nojo nenhum eu sentia. Ele passou a língua na curva do meu pescoço. Eu enrolei os dedos naquele triângulo de pêlos crespos na cintura dele. Não sei quanto tempo durou. Sei que de repente a gente se afastou e, olhando um pro outro, começamos a rir feito loucos outra vez.

Bem cedo, na manhã seguinte, fomos à praia juntos. Ele me ensinou a mergulhar e a boiar, eu apontei o horizonte e mostrei o caminho da África, das Índias. Depois do almoço, no forno quente do quarto coberto de zinco, ele me ensinou outros caminhos. Na hora de ir embora, de tardezinha, ajudei ele a arrumar suas roupas. Mas não fui até à rodoviária. Espiei da esquina, escondido. Depois corri pela calçada atrás do ônibus, até que ele saísse na janela e gritasse alguma coisa que não entendi direito. Parecia Zanzibar, Partenon, qualquer coisa assim. Ele ficou abanando até o ônibus fazer a curva, na polvadeira vermelha da estrada de Osório.

À noite, fiquei procurando umas músicas no rádio. Nem Gardel nem Elvis, encontrei Maysa, que o pai disse que eu não tinha idade para ouvir. Depravada, falou, e eu não sabia o que isso queria dizer. Na hora de dormir a mãe olhou bem pra mim e disse baixinho:
- Parece que tu está sentindo muita falta do Alex.
Eu falei que não, e não estava mentindo. Eu sabia que ele tinha ficado para sempre comigo. Ela foi dormir, apaguei o rádio. Sozinho na sala, em silêncio, eu não era mais monstro. Fiquei olhando minha mão magra, morena, quase sem pêlos. Eu sabia que o primo Alex tinha ficado para sempre comigo. Guardado bem aqui, na palma da minha mão.


FIM

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

COLETÂNEA PARTICULAR

Sempre fui um apaixonado por novelas e suas trilhas. Temas que fazem a imaginação voar e associar de imediato os personagens as suas respectivas canções.

Como a vida real não dura apenas os 8 meses que uma trama costuma permanecer no ar, ao longo dos anos vamos criando nossas próprias trilhas, músicas que embalam nossos momentos especiais, tristes, alegres, solitários e marcantes.

Não raro elegemos nossas canções favoritas quando ela está diretamente ligada a uma novela e sua bela história de amor. Aí você escuta aquela música, lembra da novela tal, que era tema de um casal marailhoso e lembra que suspirava toda vez que ela tocava. Essa lembrança por sua vez te remete a seu momento de vida pessoal e algumas coisas que talvez estivessem esquecidas volte a sua mente como um jorro de boas recordações e uma grande e incrível viagem é feita em questão de minutos.

Esse é o poder que a música tem e se for um tema de novela então..., se torna ainda mais poderosa.

Como amo muito tudo isso e já fui um colecionador voraz de trilhas sonoras, peguei emprestada a ideia de um amigo blogueiro, o Vítor do Eu prefiro melão, e resolvi, assim como ele, também fazer uma lista com meus 20 temas de novelas nacionais preferidos e inesquecíveis. Não esqueçam essa é uma lista particular, são as melhores na minha opinião.

Aleatóriamente e sem seguir uma ordem de preferência, são elas:



1) OCEANO (Djavan): Tema de Lucas e Duda em TOP MODEL de 1989, não houve quem não se apaixonasse pela música doce e triste de um completamente desconhecido Djavan, pelo menos para mim, que na época tinha apenas inocentes 8 aninhos. Mas com a sensibilidade já aguçada conseguia entender o quão forte era o amor de Duda e Lucas sempre que Oceano entrava em cena embalando o romance complicado dos protagonistas vividos por Malu Mader e Taumaturgo Ferreira, que também formavam um lindo casal na vida real.



2) DONA (Roupa Nova): Tema da personagem mais memorável de Regina Duarte. Em ROQUE SANTEIRO de 1985, a viúva Porcina com a canção entoada pelo grupo musical mais novelístico de todos os tempos, tornou-se sinônimo de poder, força, atitude e determinação. Dona é uma canção pulsante, com sangue, cheia de energia, mas ao memsotempo cantada com toda a doçura peculiar do Roupa Nova. Sem sombra de dúvidas Dona é um hino, ainda hoje, 25 anos depois, de todas as mulheres porretas, donas de seu próprio nariz. E se for empinado, melhor ainda.


3) ENTRE A SERPENTE E A ESTRELA (Zé Ramalho): Com uma letra fulminante, Zé Ramalho entrou de vez para o rol dos artistas com grandes temas de novela em seu repertório ao embalar a relação de amor e ódio entre Pilar Batista e Murilo Pontes, em PEDRA SOBRE PEDRA de 1992, com essa música estraçalha-coração. Renata Sorrah e Lima Duarte serão lembrados sempre, não só pela atuação primorosa na trama de Aguinaldo Silva, mas também por ficarem eternamente divididos entre a serpente e a estrela.



4) VIESTE (Ivan Lins): Essa é um xodó. Uma das músicas mais lindas de Ivan Lins, Vieste é romântica, melancólica e emocionante, caindo como uma luva para o apaixonado Lucas de Leonardo Vieira em SONHO MEU de 1993. Lucas fez de tudo para ficar com sua amada Cláudia e quando ficou separado dela sofreu como um condenado, chorando pelos cantos, lamentando e suspirando, sempre ao som de Vieste. O que fazia qurer pegá-lo no colo e embalá-lo até pegar no sono como um bebê. Oito anos depois em 2001 a música foi magnificamente regravada pelos não menos magníficos Lenine e Nana Caymmi, tornando-se tema de uma outra trama: ESTRELA-GUIA. Dessa vez vez a canção embalava o casalzinho Tony e Crystal, uma dupla menos empolgante que a primeira, mas ainda assim a música me arrepiava. De toda forma continuo preferindo Vieste em sua primeira versão, com Ivan Lins, Lucas, Cláudia e companhia.



5) A MIRAGEM (Marcus Vianna): Romântica ao extremo o tema de Lucas e Jade em O CLONE de 2001 foi feito sob encomenda para o casal inter-racial mais apaixonante das telenovelas. Marcus Vianna, que até então só fazia trilhas instrumentais, colocou uma linda letra em uma fascinante música. Criando um tema clássico para um novelão, Marcus viu sua canção tocar sem parar nas rádios de todo os país merecidamente. A Miragem tornou-se o hino de um amor mais forte que o tempo.



6) MENTIRAS (Adriana Calcanhoto): Depois de ouvir Adriana Calcanhoto embalando as cenas da dissimulada Mariana em RENASCER de 1993 ao som de Mentiras, um véu de novas possibilidades musicais se descortinou diante de mim. Aquela letra ousada e diferente como tema de uma personagem tão ambígua,era avassaladora. "Nada ficou no lugar/Eu quero quebrar essas xícaras/Eu vou enganar o diabo" soava até transgressor. Realmente uma grande e perfeita fusão entre música e personagem.








7) PALPITE (Vanessa Rangel): Música chiclete que fez todo mundo desejar ardentemente viver um romance cheio de aventura e tesão nas alturas, como o de Milena e Nando em POR AMOR de 1997. Ela a mocinha rica e rebelde, ele o piloto de helicóptero que trabalhava pras empressas da família dela. Em comum apenas a paixão pela liberdade e um amor capaz de enfrentar céus e terras. Nando e Milena foi o casal sensação daquele ano de 97, alçando Carolina Ferraz e Eduardo Moscovis ao patamar de grandes estrelas globais. Palpite foi o símbolo de um romance leve, profundo e irresistível, alçando a atualmente sumida Vanessa Rangel, ao patamar de nova estrela da mpb. Se o romance de Nando e Milena foi um doce e delicioso bolo a ser saboreado aos suspiros de satisfação, Palpite foi a cereja que tornou tudo perfeito.








8) AMOR E SEXO (Rita Lee): Nunca antes houve uma letra que descrevesse tão bem as diferenças entre amor e sexo. Como tema de Darlene em CELEBRIDADE de 2003, a composição sacana, inteligente e poética de Arnaldo Jabor, na interpretação cativante e inconfundível de Rita Lee, seduziu o público que torceu muito para que depois de tantas idas e vindas a manicure inconsequente louca pela fama terminasse nos braços de seu bombeirão Vladimir. Mais um marco em trilhas de novelas.










9) A MULHER EM MIM (Roberta Miranda): A linda e apaixonada versão que Roberta Miranda fez de Woman in me, de Shanya Twain, para O AMOR ESTÁ NO AR de 1997, foi tema da pérfida Úrsula, personagem de Nicete Bruno e em minha humilde opinião uma de suas atuações mais marcantes. A mulher em mim traduzia com perfeição a angústia de uma mulher amarga e solitária, eternamente apaixonada por um homem que a despreza justamente por sua arrogância e atitudes inescrupulosas. Os embates entre Úrsula e Candê, a simplória e suburbana esposa de Guima, amor de juventude da vilã, eram deliciosos. E sempre depois de esbravejar, brigar e humilhar Guima e toda sua família, ao se ver sozinha, Úrsula expunha toda sua fragilidade ao som de: A mulher em mim/ Vai então pedir/ Fala de amor/ Ah, me faz ser feliz. E eu me derretia todo com a voz lâguida e melancólica da ultra romântica Roberta Miranda.


10) BELÍSSIMA (Vanessa Barum): Dentre todos os temas escolhidos para esta lista, a canção composta e cantada por uma quase desconhecida Vanessa Barum é realmente uma escolha muito pessoal e particular. A poderosa Belíssima, música de letra forte e contundente caiu como luva para a personagem de Bruna Lombardi em O FIM DO MUNDO de 1996. A mini-novela de apenas 35 capítulos foi concebida para ser uma minissérie e ao contrário do que se divulgou na época, não foi uma super novela. Ainda assim a frágil Gardênia, com seu dilacerante tema, me marcou como ferro em brasa. Belíssima é a típica música realmente só lembrada por ter sido tema de novela, após o término da trama e daquele ano, nunca mais ouviu-se a música nas rádios, nem se soube de sua intérprete, que pelo jeito desistiu de cantar. Mas como esquecer frases como: "Nunca é tarde/ Nunca é cedo/ Quando a angústia te corrói", "A cada passo/ você perde o centro/ E sente saudade", "Se você sucumbe ao medo/ Que vem atormentar teus sonhos/ Ainda resta o fogo humano contra a hipocrisia", "Se alegre como os inocentes/ Não se torne um decadente" e "A paixão só tem coragem/ Se a vontade for valente". Um grande marco em minha vida.



11) CIRANDA DA ROSA VERMELHA (Elba Ramalho): Uma Elba Ramalho cheia de graça e ternura, entoou por muitos capítulos, lá pelos lados de Greenville em A INDOMADA de 1997, a delicada canção que embalou o doce casal Emannuel e Grampola. O deficiente mental e a prostituta que não queria ser, protagonizaram um dos romances mais meigos já visto na tv, sempre ao som de Ciranda da rosa vermelha, que tocou à exaustão, tornando impossível não associar de imediato a música à novela e seus respectivos personagens.



12) UMA NOVA MULHER (Simone): Uma mulher submissa e maltratada pelo marido, que viveu a vida toda no interior de uma cidade tacanha, ganha de presente uma longa viagem para uma grande cidade. Contra a feroz vontade do marido ela vai, com a promessa de quando voltar pagará muito caro. Meses depois a pobre Tonha volta, dando lugar a uma repaginada, linda e poderosa nova mulher. Um tema perfeito, para uma personagem inesquecível, na incrível TIETA de 1989. Na inspirada interpretação de Simone, Uma nova mulher inspirava liberdade e uma vontade louca de dar a volta por cima. Música linda, empolgante e emocionante.









13) PURO ÊXTASE (Barão Vermelho): Vontade de dançar até o amanhecer com o tema da vilã Bruna de ERA UMA VEZ..., novela das 6 mediana que empolgava toda vez que surgia Bruna e sua indefectível musiquinha cantada pelo Barão Vermelho. Eu adorava! Funcionou muito bem pra personagem de Andréa Beltrão em 1998. O que não aconteceu quando requentaram a música para a trilha de CAMINHO DAS ÍNDIAS de 2009 como tema de Duda, simplesmente porque até hoje a música tem a cara de Bruna e ninguém tasca.


14) GARGANTA (Ana Carolina): Para uma personagem forte uma música idem. Garganta, da revelação Ana Carolina de 1999, invadiu a novela ANDANDO NAS NUVENS, as rádios e a vida de milhões de fãs com muito glamour e atitude, servindo de tema para a complicada Júlia Montana de Debora Bloch. Dez anos de carreira depois e após dezenas de temas em novelas, Garganta foi tão poderosa que continua sendo dentre todos o tema mais marcante da imbatível Ana Carolina.





15) COISAS QUE EU SEI (Danni Carlos): Após um início timido como atriz e alguns cd's de cover's gravados, Danni Carlos conquistou milhões de fãs e a mídia com sua doce e personal Coisas que eu sei. Ao ser tema de Júlia em DUAS CARAS de 2007 a canção tornou-se hit, entrando para o rol dos temas inesquecíveis de novelas.







16) CATEDRAL (Zélia Duncan): Mais uma jovem cantora que estréia nas paradas de sucesso com uma deslumbrante música em novela. À época, Zélia Duncan ainda era uma ilustre desconhecida, até surgir com sua voz andrógina em 1995 cantado o tema de Irene e Diego em A PRÓXIMA VÍTIMA. No início achava que era um homem cantando, mas ao ver a tímida Zélia se apresentar no programa da Hebe, entendi que era mais uma "sapa" maravilhosa surgindo no cenário novelístico e MPBístico. E Zélia, assim como Ana Carolina, mesmo após muitas músicas inseridas em novelas, tornou sua Catedral um ícone da teledramaturgia.

17) CUIDE BEM DO SEU AMOR (Os Paralamas do Sucesso):Diana e Alexandre tiveram seu romance embalado por esta bela canção dos Paralamas em SABOR DA PAIXÃO de 2002. A novela era fraca, mas a música maravilhosa, valia a pena assistir alguns capítulos só para escutá-la.










18) SE EU NÃO TE AMASSE TANTO ASSIM (Ivete Sangalo): Composta por Herbert Vianna e interpretada com maestria por Ivete Sangalo, Se eu não te amasse tanto assim entrou na trilha da tresloucada UGA UGA de 2000, como tema do amor pra lá de complicado de Baldocchi e Maria João. Apesar da novela ser uma comédia rasgada, o tema romântico de Ivete fez grande sucesso e emocionou o país.





19) PRÓPRIAS MENTIRAS (Deborah Blando): Em LAÇOS DE FAMÍLIA de 2000, Deborah Blando cantava o tema de Deborah Secco. Duas fantásticas Deborah's, uma interpretando a canção, outra o personagem. Blando voltava aos temas de novela após significativa ausência, arrasando com uma letra que descrevia à perfeição a personagem de Secco, esta em seu melhor papel na pele da atrevida e hiperativa Íris. Ao som de Próprias mentiras Íris protagonizou cenas inesquecíveis ao dançar semi-nua sozinha na frente do espelho. Uma música sofisticada com a qual me identifico muito. "Cuide do seu nariz, você fala demais."




20) VOCÊ ME VIRA A CABEÇA (Alcione): A rainha marrom, Alcione, cantava todo seu romântismo em DA COR DO PECADO de 2004. Abalando corações, o tema de Preta, arrasava com qualquer um por onde tocasse. Até essa canção, não era fã de Alcione, mas após derramar seu coração com uma letra pura-fossa como a de Você me vira a cabeça, a Marrom me ganhou de vez. Impossível ficar imune à uma canção tão visceral. Fechando esta lista com chave de ouro.


Em breve voltarei com a lista das internacionais.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

PEQUENO MONSTRO - PARTE 4

Continuação da crônica de Caio Fernando Abreu:





O quarto virava um forno depois do almoço. O sol batia no telhado de zinco, ficava tudo fervendo. Pensei que se eu ficasse ali, todo aquele maldito qui-suco ia começar a ferver na minha barriga, até sair uma espuma vermelha pela boca, e cair no chão babujando e me batendo pelas paredes. Podia ser que pelo menos assim alguém no mundo prestasse atenção em mim. Peguei o livro de Tarzan, passei pela cozinha, onde eles coninuavam berrando, fui deitar na rede, embaixo dos ema-momos, onde batia uma fresca. Mas mesmo ali, na sombra boa, não conseguia parar de pensar que a minha vida era um inferno. E que se um dia eu saísse mesmo caminhando reto por cima do mar, mesmo que não pisasse sobre a bosta das águas, que nem Jesus Cristo, ia ser ótimo pra todo mundo se eu afundasse de uma vez e ninguém me encontrasse nunca mais, afogado para sempre no fundo do mar que nem o Titanic. Tentei ler, mas aquela lenga-lenga dos sacerdotes nas cavernas de Opar estava me enchendo um pouco o saco.

Uma cara morena de cabelo preto, me espiava por cima da rede. Uma cara morena muio próxima, um cheiro forte de suor e de mar. Quase gritei, porque logo que abri os olhos e dei com aquela cara e aquele cheiro não lembrei que tinha deitado ali na rede, depois do almoço. Acho que estava sonhando com Jad-Bal-Ja, o leão de ouro, e foi nisso que pensei quando vi aquela cara morena me espiando por cima da rede. Mas toda morena, meio de cigano, não era cara de leão. Era a cara do primo Alex, de sobrancelhas pretas bem cerradas grudadas em cima do nariz. Ele sorriu pra mim, mas a cara estava perto demais, não consegui sorrir de volta nem nada, por educação que fosse. Desviei os olhos para o livro de Tarzan no meu colo, depois franzi as sobrancelhas pra ver se ele se tocava. Mas parece que não se tocou. Empurrou a rede, se afastou um pouco e ficou me olhando enquanto eu balançava feito um idiota, com ele me olhando de braços cruzados e pernas abertas.

- A tia disse que tem um chuveiro aqui fora - ele falou com uma voz meio rouca, mais grossa que a do pai, e muito educada - Pra mim tirar a areia antes de entrar em casa. Onde que é?
- Ali, ó - eu apontei o fundo da casa. Ele me olhou mais um pouco, os braços cruzados. Eu só podia ver a cara dele com os cabelos duros de sal e areia e uns pedaços de corpo que subiam e desciam, com o balanço da rede, as pernas abertas. Pelo menos não usa calção-saia, pensei, aqueles calções de náilon todos largões que estava na cara que uma pessoa que usava um calção desses nunca tinha ido à praia na vida, calção de baiquara. Mas o dele era preto, bem decente até.
- Tu não gosta de ir à praia? - ele perguntou - A tia...
- Não - eu falei. E já sabia, a mãe tinha dio que eu não gostava de ir à praia, que não falava com ninguém, que dormia até a hora do almoço, que ficava trancado no quarto, que dava pontapés na porta e tudo. Ela decerto já tinha contado pra ele: que eu era um monstro. Depois achei que ele não tinha culpa, coitado, ela é que ficava falando sem parar, e tentei ser mais educado. - Só gosto de tardezinha, na hora do pôr-do-sol.
- Ah! - ele disse. E achei bacana ele não dizer mais nada, que deva acordar mais cedo, aproveitar o sol e todas aquelas besteiras. Eu não conseguia olhar direito pra ele, aí estendi uma perna, finquei os dedos do pé na grama e fiz a rede parar de balançar. Então olhei. Ele tornou a rir, uns dentes nuito brancos, ou só pareciam muito brancos porque ele estava super moreno. Não tinha ficado nem um pouco vermelho do sol. Passou a mão pelo peito, pela barriga, pelas pernas, a areia caiu no chão. A voz da mãe gritou lá de dentro pra ele ir almoçar. Eu abri o livro, fiz que ia começar a ler, aí ele riu de novo e foi caminhando devagar pro chuveiro. Parecia um leão, mesmo moreno,pensei, andando daquele jeito, meio de lado. Eu comecei a ler. Seus musculosos dedos de aço formaram-se no centro de uma das barras. De costas para mim, embaixo do chuveiro, as costas dele eram retas, largas, com um pequeno triângulo de pêlos crespos e pretos mais largos onde subiam para a cintura, mais estreitos quando desciam em direção a bunda. Ele abriu o chuveiro, soltou um grito quando a água gelada começou a cair. Com a mão esquerda segurou na outra e apoiando um dos jelhos de encontro à porta, vagarosamente dobrou o cotovelo direito. Cada braço dele era assim quase da grossura da minha coxa. A água começou a levar embora a areia da praia, e agora eu podia ver melhor o corpo dele, escondido embaixo da camada de areia. Eu não conseguia parar de olhar. Ondulando como aço plástico, os músculos de seu antebraço e os bíceps cresceram até que gradualmente a barra arqueou na sua direção. Ele virou de frente, com as duas mãos afastou o calção e avançou um pouco o corpo para a água bater na barriga e descer por dentro do calção. Enfiou as mãos por dentro do calção, depois olhou pra mim, entre as gotas do chuveiro e virou a cabeça, cuspindo água. O homem-macaco sorriu, enquanto agarrava de novo na barra de ferro. Quando ele fechou o chuveiro, sacudindo os cabelos molhados, quando as gotas do cabelo dele respingaram na minha cara e a mãe tornou a chamar lá de dentro, de repente e sem querer eu fechei com força o livro, pulei pra fora da rede e saí correndo em direção à porta da casa.

Pelo resto daquele dia, não consegui fazer mais nada. Até parece que nos outros dias eu fazia alguma coisa mais, além de me atrolhar pelos cantos, morto de calor, dormir ou caminhar vadio pela praia. Pois nem isso consegui. Me deu assim um disparo no coração, feito susto que não era bem susto, porque não tinha medo de nada. Ou tinha, medo de uma coisa sem cara nem nome, porque não vinha de fora, mas de dentro de mim. Uns frios, mesmo parado debaixo de um sol de rachar, olhando minha sombra achatada igual a de um marciano monstro verde, e uns calorões, mesmo atrás da casa, onde até lesma tinha, de tão úmido. Eu só sabia que por nada desse mundo queria ficar perto do primo Alex.

Escondido, vi quando ele entrou no quarto e encostou a persiana da janela, porque decerto ia tirar uma sesta. Todos tiravam sesta no mundo, menos eu, pequeno monstro. Fiquei acompanhando com a ponta do dedo um rastro prateado de lesma, naquele lugar frio atrás da casa até passar um tempo. E, quando saí no sol outra vez, vi que o tempo tinha passado, porque a minha sombra já não estava tão achatada nem tão monstra. Então cheguei bem devagarinho perto da janela do quarto e, sem barulho nenhum, empurrei a persiana. De leve, como se fosse um vento. Ele estava nu, de costas para a janela. Um pouco mais abaixo daquele triângulo de pêlos crespos e pretos na cintura, o calção tinha deixado uma marca branca, que parecia mais branca ainda, agora que o vermelho do sol começava a acender. Ele estava deitado em cima do braço esquerdo. O braço direito dele que eu só podia ver até a metade, estava dobrado na cintura, desaparecia na frente do corpo. E se mexia. Todo parado, o primo Alex, só mexia o braço direito que eu não via inteiro, porque ele estava de costas para mim. Cada vez mais depressa eu tranquei a respiração, o queixo apoiado na janela, e cada vez mais depressa, até que ele primeiro gemeu baixinho, depois mais alto, suspirou, o corpo inteiro tremendo, virou de bruços na cama e afundou a cara no travesseiro. O braço direito caiu ao lado da cama. Da ponta dos dedos dele, que quase tocavam o chão, escorria uma gosma meio branca, meio prateada, que foi deixando no piso um rastro igual ao das lesmas no fundo da casa.

Ainda era muito cedo, mas fui caminhar na praia. Saí correndo pela areia em direção ao farol, e quando vi que não tinha mais ninguém por perto, comecei a gritar: Sumatra, Tantor, Zanzibar, Bukula ou Nikima, parecia louco de hospício. Não conseguia parar, só parei quando coração disparou demais e minha cara ficou lavada de suor, bem na frente do farol. Então olhei em volta, vi que não tinha ninguém, e fiz uma coisa que nunca tinha feito antes. Tirei a bermuda e a camisa, larguei na areia e fui entrando na água completamnete pelado. Abri as duas pernas, os dois braços, me joguei no meio da espuma. Dei de bunda na areia do fundo do mar, mas não doeu. Aí me virei de bruços e comecei a esfregar meu pau completamente duro na areia molhada molinha. Ficava cada vez mais duro, parecia que tinha uma coisa que queria sair de dentro dele, um fio prateado brilhante. Mas não saía, a areia ardia, o sal queimava. Aí eu peguei e abri a minha bunda com as duas mãos bem no lugar onde as ondas arrebentavam, e fiquei assim, deixando as ondas arrebentarem e a espuma morna do fim da tarde entrar pela minha bunda aberta. Foi me dando uma tontura, eu sem querer pensei no braço direito do primo Alex, cada vez mais depressa, parecia assim que ia explodir alguma coisa. Não explodiu nada, eu cravei as unhas no braço falei quinze vezes pequeno-monstro-niguém-te-quer e não sabia mais o que fazer da vida, daquele medo ou coisa que queria porque queria sair de dentro de mim sem encontrar o jeito. Meu coração batia batia quando cheguei em casa, a mãe já estava botando a mesa da janta. Vai lavar as mãos, o pai falou sem me olhar, ele nunca me olhava. Deixei a água correr sem me olhar no espelho. Quando voltei, o primo Alex já estava sentado, riscando o xadrez da toalha com a ponta serrilhada da faca. Eu não olhei pra ele, mas mesmo sem olhar dava pra ver que ele tinha vestido uma camisa branca de banlon bem alvinha e tinha penteado o cabelo. Eu não queria olhar pra ele, mas aí a mãe foi colocar o ovo e o bife no meu prato e o pai falou: tira as aspas do prato guri, também que coisa, parece um bugre. Eu fiquei vermelho de vergonha, dele falar assim, daquele jeito comigo, na frente do primo Alex, e sem querer ergui a cabeça, levantei os olhos. Ele apertou aquelas sobrancelhas pretas, grudadas em cima do nariz e piscou pra mim, como se a gente tivesse um segredo. Fiquei ali feito besta olhando de vez em quando pra ele. Ele sempre olhava de novo pra mim por cima da jarra de qui-suco que na janta era de laranja, não de groselha. Vez em quando piscava, vez em quando ria, sem ninguém ver, como se tivesse uma coisa que só acontecia entre ele e eu. Uma coisa que era um pouco essa vontade minha de ficar olhando sem parar pra ele. Podia ser essa vontade misturada com aquele medo, aquele braço se mexendo cada vez mais depressa, aquele fio prateado de gosma brilhnate estendido no chão. Parecido com a calda da compota de pêssego que outra vez eu virei na toalha quando a mãe parou um pouco de falar e, antes que o pai me chamasse de porco, perguntou assim:


CONTINUA...