sábado, 29 de dezembro de 2012

RETROSPECTIVA 2012

Enfim, 2012 foi um ano cheio, cheio de preocupações e angústias. E como esta é a última postagem do ano, nada melhor do que fazer uma curta retrospectiva, pra exorcizar de vez tudo que foi indigesto. Sem querer ser negativista, houve pouquíssimos momentos de deleite e prazer em minha trajetória esse ano. Posso contar nos dedos quais foram eles. 

O dia em que estive com Pilar e passamos uma noite extremamente agradável, saboreando um delicioso buffet de sopas na confeitaria Bella Paulista, onde conversamos sobre tantas coisas que precisavam serem ditas, refletidas e ponderadas, e tiramos fotos e vimos gente famosa e fizemos compras. Foi um dia marcante e gratificante pra mim que ficou gravado na memória e perdido naquele friorento mês de maio. Também em maio, matei 3 dias de trabalho e fiquei um fim de semana inteiro refletindo sobre meu destino na Livraria Cultura. Foram 3 dias decisivos e reparadores, em que ocorreu a virada cultural, com manifestações artísticas gratuitas por toda a cidade de São Paulo e nesse embalo tive uma noite deliciosa numa baladinha bem trash na Rêgo Freitas, acompanhado de Said e um namoradinho que ele tinha na época. O lugar não era dos melhores, mas a noite foi regada a muita música e risada, foi ótimo. Falando ainda de momentos bons, não posso negar que ser selecionado pra trabalhar na Cultura, uma livraria que sempre sonhei estar como funcionário, foi um grande momento de alegria e êxtase. Mal sabia eu o que me esperava.

Dois mil e doze foi um ano em que fiquei à margem, a beira de um ataque de nervos. Tinha sempre algo fabuloso prestes a acontecer, mas a bola sempre batia na trave, todas as vezes, o tempo todo. A começar pela faculdade, a tão desejada faculdade, o bendito curso superior, que quando tudo parecia estar encaminhado pra grande realização em terras são paulinas, a pedra no meio do caminho. Adiei o curso de letras porque não havia formado turma no campus Vergueiro, próximo de casa, e eu não tinha a possibilidade de estudar em outro campus. Falta de organização da universidade e falta de um plano B da minha parte. Atordoado parti pras lamentações e chororôs, até receber uma ligação do RH da livraria. Entre o telefonema, os testes, a contratação e meu pedido de demissão da Dedic, correram uns 7, 8 dias. Parecia perfeito, mas tudo se tornou um pesadelo em bem pouco tempo.

A distância no trajeto casa-trabalho-casa, a arrogância e hostilidade de certos colegas, a falta de interesse e má vontade dos tutores em explicar o ofício e erros gravíssimos envolvendo salário e benefícios. Por maior paixão que eu tivesse pelos livros e maior desejo de fazer parte da equipe Livraria Cultura, que confirmo com convicção é a melhor rede de livrarias do Brasil, não teria como suportar tantos dissabores de uma só vez. Fiquei os 3 meses da experiência e saí com uma sensação de liberdade e tristeza. Me senti leve e livre de tanta gente maldosa e de energia pesada, mas também triste por constatar que a realidade muitas vezes é completamente diferente dos sonhos que a gente acalenta, infelizmente pra pior.

Saindo da Cultura curti umas duas semaninhas de puro ócio, até entrar numa fria, menos pior que a anterior, mas uma fria de qualquer jeito. Fui trabalhar na Intervalor, uma empresa de tele-cobrança, pois é, acabei voltando pro telemarketing. Ambiente agradável, pessoas legais, mas salário completamente incompatível com as minhas necessidades. Depois de dois meses, estava em total desespero, precisava de outro emprego o mais rápido possível. Aluguel atrasado, contas acumulavam, socorro, alguém me ajuda! No início de setembro estava eu, começando tudo de novo no Carrefour, sim, o supermercado, como recepcionista de caixa. Trabalho humilde, estressante, cansativo, mas digno. E hoje afirmo com toda a convicção do mundo, quero e pretendo ficar no mínimo um ano nesse lugar e até agora estou suportando bem, sem grande sofrimento. É tudo uma questão de foco. Entrei cheio de expectativas na Cultura e me ferrei, sem expectativas nenhuma no Carrefour quem sabe atinjo meus objetivos tão acalentados.

Mas nem só de trabalho foi feito meu ano, também teve brigas, reencontros, reconciliação e uma pequena viagem. 

Briguei com Luli em fevereiro, rompemos e ficamos três meses sem nos falar. Em maio, voltamos as boas. Em junho, minha mãe passou por aqui antes de viajar pra Sergipe, ficou 3 dias comigo. Passeamos e matamos a saudade. Na volta pra casa passou novamente por aqui. O que acabou causando um estresse idiota e desnecessário com a proprietária do prédio, que não permite visitas. Mas que se dane, jamais deixaria de receber minha mãe por causa de uma regra radical e imbecil. Em julho discuti virtualmente com Everton, ele me excluiu do facebook e paramos de nos falar até poucos dias atrás. Em 23/12 tivemos um almoço de reconciliação. Antes dessa pequena rixa, em 19 de junho fizemos um café na casa dele, juntamente com João, em comemoração a um ano meu aqui em São Paulo. E em Novembro, aproveitando alguns dias de folga do Carrefour, consegui viajar até Capão da Canoa. Foram apenas três dias, mas deu pra aquietar meu coração, que já estava indócil por não poder rever os amigos e a cidade que me foi tão acolhedora no período em que lá vivi. Revi Daniel, Luísa, Jennifer, Adelane mas não consegui rever, Robson, Vagner, Jonas e tantos outros. Comi a comidinha incomparável de mamãe. Fui recebido por um churrasco sensacional, preparado inacreditavelmente pelo meu pai, que está de volta sob o mesmo teto que a esposa que ele abandonou, provando mais uma vez que o mundo dá muitas voltas.

Por fim, foi um ano emocionalmente turbulento, mas sem paixões platônicas, o que já é uma grande vantagem. Foi o ano em que comecei a escrever meu primeiro livro e ainda não consegui terminar o primeiro capítulo, mas tudo bem, o importante é persistir. Foi um ano que me maltratou um pouquinho, mas só pra não perder o lugar comum, saio dele mais forte, desejando pra 2013 os mesmos desejos que ainda não realizei e com a mesma fé de sempre. No dia 31 estarei na praia e pedirei tudo igualzinho a anos anteriores, quem sabe dessa vez dá certo.

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

CINEMA 2012

Sim, eu confesso, assumo que contabilizando minhas idas ao cinema nesse 2012, foi uma vergonha. Míseras 7 vezes! Inadmissível para alguém que se pretende um cinéfilo de carteirinha, mas foi isso mesmo, apenas sete vezes me dispus a sair de casa pra assistir um filme na grande tela e no escurinho. Sei lá, não sei explicar, admito que já fui mais entusiasmado com o ato de ir ao cinema e nesse último ano andei meio desanimado, talvez a oferta não tenha sido tão boa quanto a de outros tempos, mas enfim, o fato é que ainda gosto muito e esse ano realmente não tivemos produções cinematográficas de muito impacto, nem tão empolgantes assim, pelo menos pro meu gosto. De qualquer maneira, vale registrar os 7 filmes que me fizeram sair de casa em 2012:

  
Românticos Anônimos: Primeiro filme que assisti este ano, em 1 de janeiro, no cinema Reserva Cultural da Paulista. É uma comédia romântica bem bonitinha que assisti por dois motivos principais, é francês e se passa numa pequena fábrica de chocolates. Na história, Jean-René é dono dessa fabriqueta de chocolates que está prestes a fechar as portas porque seus doces não fazem mais tanto sucesso como antigamente, e Angélique é uma talentosa chocollatier, que após ser contratada por ele acaba salvando a fábrica da falência. Os negócios no entanto, são apenas o pano de fundo para a curiosa história de amor que acontece entre os dois. Angélique e Jean-René têm muito mais em comum do que imaginam. Os dois são solitários e carentes. Querem conhecer alguém com quem possam se relacionar e viver uma história, mas não conseguem porque são patologicamente tímidos e aí entra o tom cômico de todo o filme. Na tentativa de um encontro romântico ou de uma noite de amor, os dois passam pelas situações mais constrangedoras que acabam se tornando hilárias por conta da timidez excessiva que os impedem de concluir o que começam. No final entendemos que quando duas pessoas se amam de verdade sempre se dá um jeito, nem que seja um jeito bem maluco.


Os Descendentes: Em 20 de fevereiro, no Cinemark do Pátio Paulista, foi a vez do concorrente ao Oscar, com George Clooney no papel principal. Curto e grosso: não gostei. O filme não é ruim, mas fizeram tanto oba-oba em cima dele que acabei criando uma grande expectativa, que não foi superada. Na história, Clooney tem que lidar com o coma da mulher que sofreu um acidente de barco, enquanto cuida de duas filhas, uma adolescente de 17 anos e uma garotinha de 10, ao mesmo tempo que precisa decidir se vende ou não as terras que herdou no Hawai. Em meio a tudo isso, ele ainda descobre por meio da filha mais velha que sua mulher tinha um amante e precisa lidar com sentimentos contraditórios de raiva, mágoa e piedade enquanto a esposa definha. Não deixa de ser um bom drama, a fotografia com as belas imagens do Hawai é lindíssima, mas o filme não me cativou.

 Shame: Quando o assiste em 17 de abril, no Unibanco Arteplex da Augusta, comentei que não sabia se tinha gostado, não consegui formar uma opinião logo após tê-lo visto. A verdade é que este Shame não mexeu comigo, nem pro bem, nem pro mal. Talvez porque o sexo já esteja tão banalizado, a ponto de uma história que narre o vício de um homem comum pelo mesmo e suas consequências em seu cotidiano e emocional, não me dizer nada. Ainda não sei explicar os motivos, mas imaginava que o filme fosse mais chocante, algo estarrecedor. Acho que o diretor pegou bem leve, ou eu que já não me choco com quase nada. Valeu pelo tão alardeado e brevíssimo nu frontal de Michael Fassbinder.


O Espetacular Homem-Aranha: Certamente não é o melhor filme já produzido do Homem-Aranha, mas o elenco é o melhor. Constatei isso em 15 de julho, no Espaço Itaú do Shopping Frei Caneca. Achei Andrew Garfield uma escolha muito melhor que o inssosso, porém excelente Tobey Maguirre. Ema Stone não está a altura de uma Kirsten Dunst, mas funciona muito melhor e cativa muito mais como a namorada do herói aracnídeo. Sally Field na pele da querida tia May é muito amor. Este novo Homem-Aranha, é mais garoto, mais impetuoso, mais divertido, mais leve e bem mais sexy. Seu primeiro filme não superou os anteriores com Tobey, mas certamente superará muito em breve.

  Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge:
E ainda na onda dos super-heróis, fui assistir em 5 de agosto, o último episódio da trilogia do Homem-Morcego vivido por Christian Bale, que deixou vários ganchos para um novo filme. Batman é sempre Batman, bom mesmo que seja ruim, e esse foi muito bom. Com um elenco estelar, como já é de praxe, o diferencial dessa vez foi a volta da Mulher-Gato totalmente repaginada. Anne Hathaway na pele de uma ladra pra lá de charmosa e dissimulada, deu vida a uma Mulher-Gato que não supera a de Michelle Pfeifer, porém ganha o segundo lugar com honras. Destaque também para o delicinha Joseph Gordon-Levitt e a deslumbrante Marion Cotillard.

  
As Vantagens de Ser Invisível: No dia 22 de outubro, fui ver no Espaço Itaú do Shopping Bourbon, a este que pra mim foi o melhor filme do ano. Pra falar tudo de bom que esse filme tem, e todas as sensações que ele provoca, e o quanto ele mexe com os nossos sentimentos, porque fala de uma coisa que é comum a todos nós, que é aquela fase turbulenta da adolescência, onde ser parte de alguma coisa se faz absolutamente necessário, teria que fazer uma resenha só pra ele. Mas bem resumidamente o filme é isso, uma grande história de amor que mostra o poder de uma forte amizade, poder capaz de superar traumas inimagináveis. Somos arrebatados pela história de Charlie, Sam  e Patrick em atuações apaixonantes de Logan Lerman, Emma Watson e Ezra Miller, ao som de uma trilha sonora com canções emblemáticas dos anos noventa de arrepiar e que nos dá aquela vontade nostálgica de ser infinitos.


Amanhecer - Parte 2 (Final): Pra terminar o ano, não poderia deixar de ver o capítulo final da saga mais badalada dos últimos quatro anos. Crepúsculo, uma grande e gostosa fantasia, que pra mim acabou em 26 de novembro. Para tristeza de muitos e alegria de tantos outros, não teremos mais os embróglios amorosos de Bella, Edward e Jacob. 

terça-feira, 25 de dezembro de 2012

O QUE LI EM 2012

Neste dia de natal, uma pequena lista do que li neste ano que está quase terminando:






Encerro o ano com estas três maravilhas da foto acima. Comprei-os no início deste mês e já li dois, o Noite em Claro da Martha Medeiros e O tigre na sombra da Lya Luft. Já estou na metade de Um lugar na janela - Relatos de Viagem da Martha Medeiros e certamente acabarei antes que o ano se finde. Como tudo da Martha, é tão bom e deleitoso que é impossível não devorá-lo rapidamente. Mas ao longo do ano, passou pelas minhas mãos coisas gostosinhas de se ler e outras nem tanto.

Iniciei minhas leituras em 2012 com ela mesma, a Marthinha do meu coração. Encontrei seu Topless de 1997, sem querer na livraria do Espaço Itaú de Cinema, enquanto esperava a sessão do meu filme começar. Em formato pocket e por um precinho camarada, um dos poucos dela que ainda não tinha lido, foi impossível não levar. Depois do filme e com meu livro em mãos, voltei pra casa feliz, feliz. O que achei do livro? Seria uma redundância tecer elogios a mais essa obra da querida Martha Medeiros.

Em seguida caiu em minhas graças, através da amiga Luli, o livro de crônicas do Walcyr Carrasco, Pequenos delitos, lançado em 2004, que com seu humor peculiar, discorre sobre as mais diversas situações do cotidiano de forma leve e pessoal. Também por meio de Luli, pude ler Almodóvar pela primeira vez, depois de assisti-lo tantas vezes. Seu Fogo nas entranhas, poderia ser mais um dos sensacionais filmes que dirige com grandes doses de humor, erotismo e uma pitada de bizarrice.

Depois vieram O rio do meio e Mar de dentro, ambos de Lya Luft. O que dizer sobre eles? Lya Luft é Lya Luft, com seu estilo muito próprio, mas sempre tocante e cruamente verdadeiro demais. Lê-la é sempre uma sessão de análise gratuita e gratificante. Terminando Lya, parti para Em Paris tudo acontece... de Bernadete Zagonel, autora desconhecida, formada em musicologia, que após passar uma temporada em Paris escreveu um livro sobre suas impressões da cidade e seus costumes. Talvez se ela fosse formada em letras ou jornalismo o livro seria melhor escrito. Resolvi lê-lo achando que faria uma viagem deliciosa pela capital da França, mas não ocorreu todo o deslumbramento que eu esperava durante minha leitura. Mas pronto, acabou, passou, foi apenas um deslize.

Para recuperar o tempo perdido com o livro anterior, comecei a ler Mentiras sobre o travesseiro, um romance de temática gay escrito por Raphael Mello, jovem autor que conseguiu desperdiçar quase 500 páginas numa estória mal escrita, com dezenas de erros de português e revisão e absolutamente previsível e sem graça. Não me serviu nem como entretenimento puro e simples, queimaria ele sem nenhum peso na consciência. Raiva de ter lido esse livro.

A essa altura me sentindo com dedo podre pra escolher livros, resolvi não arriscar e pegar um gênero que adoro, que são as crônicas. Foi aí que descobri Tati Bernardi com seu b(s)acaninha Tô com vontade de uma coisa que eu não sei o que é. Digamos que Tati é uma Martha Medeiros vinte anos mais nova. Talvez a comparação seja exagerada, mas que ela está no caminho, isso tá. Tati é jovem, moderna, antenada, formada em publicidade é roteirista de vários programas da Rede Globo, entre eles algumas novelas e até esse ano eu desconhecia sua existência. Sua escrita é esperta e fala principalmente sobre os anseios da mulher contemporânea, carreira, beleza, idade e amor, amor, amor. Sempre irônica e sarcástica, Tati é engraçada até quando tenta falar sério. Adorei seu livro, que sem dúvida nenhuma foi minha revelação literária de 2012. Aguardo ansioso seus próximos lançamentos.

No embalo de Tô com vontade... emendei Receitas para mulheres tristes do colombiano Héctor Abad. Livro poético com premissa interessante onde o autor tenta através de receitas culinárias oferecer consolo para o sofrimento feminino em suas mais diversas formas. Receita para um amor feliz, para aplacar a solidão, para o medo da velhice, para a angústia, os desejos proibidos, a falta de desejo e assim por adiante. Esperava mais, mas valeu a intenção do autor que foi realmente original.

O livro Palavra por palavra foi um investimento que fiz em mim. Na narrativa de Anne Lamott ela dá dicas valiosas para quem deseja escrever um livro. Maior identificação comigo impossível. Após ler o enunciado da capa: "Instruções sobre escrever e viver - Você acha que tem um livro dentro de você? Anne Lamott vai lhe mostrar como colocá-lo para fora." Não tive a menor dúvida, comprei-o na hora, e suas dicas são realmente proveitosas, simples e realistas. Será meu xodó por muito tempo.

Malas, memórias e marshmallows de Fernanda França, é uma gostosura. Um legítimo chic-lit (leitura bem mulherzinha, quase adolescente), bom de ler descompromissadamente só pelo prazer de embarcar numa vida cheia de situações e acontecimentos que você adoraria que acontecesse com você. O livro é praticamente uma comédia romântica dessas que você vê no cinema com a Kate Hudson ou Anne Hathaway, mas ali você lê e apenas imagina quem seria a mocinha perfeita pra viver a protagonista Melissa Moya, que embarca em uma grande viagem geográfica e emocional ao embarcar a trabalho rumo aos Estados Unidos. Leitura previsível, porém fofa. 

Embarcando em algo mais realista, iniciei Dias de mel. Um relato verdadeiro de Annia Ciedzadlo, que em 2003 resolveu passar a lua de mel em Bagdá. O destino nada óbvio para uma norte-americana se justifica pela decisão de seu marido Mohamad, que era jornalista nos Estados Unidos, de cobrir a invasão do Iraque e voltar ao Líbano, sua terra natal. Neste livro a autora fala sobre os anos na Bagdá ocupada pelas forças da coalizão e na Beirute marcada pelas divisões sectárias. Fala, também, sobre o dia a dia das pessoas, sua relação com a família de Mohamad, as diferenças culturais entre Oriente e Ocidente e sobre a possibilidade de resolver os conflitos com uma mesa cuidadosamente preparada. Infelizmente não consegui lê-lo até o final por motivos pessoais, mas assim que tiver uma nova oportunidade quero terminá-lo, porque a doçura com que Annia escreve sobre um tema tão espinhoso e por vezes indigesto vale muito ser conferido até o final.

Pequeno comentário sobre um livrinho mequetrefe chamado Onde estou, meu amor?. Outro de temática gay mal escrito, bem mal escrito por um tal de Rogério Moreira Barbosa. Sem mais sobre esse erro disfarçado de livro, minhas leituras seguiram-se com Um livro por dia sobre a temporada parisiense do jornalista Jeremy Mercer na Shakespeare and Company, famosíssima livraria francesa. Livro fraco, mas digno. E o caderno Granta, que em sua nona edição trás uma seleção com Os Melhores Jovens Escritores Brasileiros e seus mais diversificados contos. Ganhei de presente, achei interessante, mas pouca coisa me cativou ali. 

E assim foi meu 2012 em termos de literatura. Que em 2013 seja melhor!

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

QUERO UM AMOR

Sim, eu quero um amor. Mas quem não quer? O correto então seria acrescentar uma palavrinha à frase. Sim, eu também quero um amor. Mas, veja bem, eu disse um amor, não um namoro. Qual a diferença? Toda a diferença. Um namoro não é, nem nunca foi sinônimo de amor. E tem muita gente por aí desesperada por um namoro, acreditando que esse é a solução de todos os seus problemas. Pensam em amor sim, claro, mas o principal são os amassos, andar de mãos dadas na rua, a companhia pro cinema e mais do que qualquer outra coisa, a imensa satisfação de dizer "tô namorando" ou "meu namorado isso... meu namorado aquilo...". Uso o substantivo masculino, porque isso é bem coisa de mulher e gay, esfregar na cara dos pobres encalhados e de todo o resto, que têm um namorado. Homens heterossexuais com raras exceções, não fazem questão nenhuma de espalhar aos quatro ventos que têm uma namorada. Seja por terem uma natureza mais discreta ou por sacanagem mesmo, eles não fazem questão, não tratam o namoro como um troféu, com raras exceções repito.

Como gay posso afirmar que não tenho a necessidade da maioria deles. Seria hipocrisia dizer que não desejo namorar, ter alguém pra ir ao cinema, andar de mãos dadas e dar uns amassos. Claro que sim. A diferença é que pra mim faço tudo isso sem necessariamente estar namorando, o namoro não é uma condição para tais atividades. Vou muito ao cinema sozinho e não sofro, porque amo minha companhia. Conheço pessoas que acham ir ao cinema só, impensável, bom mesmo é ter uma companhia, de preferência um ficante, um peguete ou glória das glórias um namorado. Preferem ficar em casa assistindo filme no dvd e reclamando que não têm um namorado pra dar uns amassos no sofá. Beijar na boca também é fácil, basta chegar em qualquer balada com esse intuito e pronto, depois de umas boas pegadas é só sair de mãos dadas até a porta ou a parada da condução que te levará de volta pra casa no final da noite. 

Por carência ou medo de serem apontadas como pouco desejáveis e encalhadas, ou as duas coisas, pessoas se tornam patéticas na busca por um companheiro, e confundem isso com amor. Essas pessoas não querem ser amadas, querem apenas não ficar sós, não passar recibo de quem não pega ninguém. Então, entre não pegar ninguém e pegar qualquer um, fica-se com a segunda opção, e vemos um desfile dos mais bizarros casais sendo formados por aí a fora, sejam eles gays ou héteros. Nesses casos, às vezes o amor vem, outras não. 

Mas voltando ao amor que eu quero, esse não virá com um namoro. Pra mim o amor precisa vir antes, pra então ser seguido de um namoro. É aquele momento em que você já conhece a pessoa tão bem, já teve todas as comprovações de que ela é tudo que você quer e ambos já estão tão impregnados um do outro que não resta outra saída do que selar o relacionamento com um namoro que será naturalmente muito bonito, forte e consistente, porque houve um encontro de almas ali, construído com muita calma, serenidade e descobertas fascinantes que não deixam dúvidas de que você encontrou "a pessoa".

É um amor assim que eu quero. Encontrar alguém, olhar pra pessoa, mas não só olhar, enxergá-la, e quero que ela me enxergue também. Desejar beijá-la num primeiro momento, porque me senti atraído por ela, porque me provocou um arrepio na espinha, porque quando bati os olhos nela, imaginei que pudesse ser "a pessoa" e ainda assim não beijá-la, porque minha maior urgência é ouvir a sua voz, saber seu nome, decorar cada detalhe do seu rosto, descobrir quem é aquela pessoa por gestos, olhares, sorrisos, suspiros e ter certeza de que não estou enganado. Certo das primeiras impressões, descobrir afinidades. Um amor que me deixe encantado a maior parte do tempo, que fale uma segunda língua, ou pelo menos tenha vontade de aprender. Que se interesse por arte, literatura, cinema, teatro, museus, viagens. Que seja curioso, criativo, talentoso. Que goste de gastronomia, novela, seja leve, bem humorado, bem resolvido, tenha bom gosto musical. Que me mostre coisas novas, me explique coisas que eu não entendo, mas que também aprenda comigo, que eu também apresente a ele coisas que não conhece, sempre numa troca sem fim. É imprescindível que seja inteligente e culto, mas acima de tudo que me ame muito, profundamente, com todas as forças de sua alma e coração. Não quero amar sozinho. Reciprocidade é tudo que eu quero.

Esse é o amor que eu quero pra 2013, mas também quis em 2012, 2011, 2010, 2009, 2008... E se não vier, continuarei querendo até o fim. Idealizado, clichê, surreal? Pode ser, mas não abrirei mão desse amor por tanto tempo aguardado, pra me jogar nos braços de qualquer um, por puro desespero ou medo de ficar sem ninguém. Como já dizia a canção do Kid Abelha "eu quero você, como eu quero..." e se não for como eu quero, penso que a solidão às vezes pode ser a melhor companhia.

  

domingo, 9 de dezembro de 2012

DA SÉRIE: OS FILMES DA MINHA VIDA - EU MATEI MINHA MÃE (11)






Um filme canadense, dirigido pelo jovem cineasta Xavier Dolan, que também protagoniza a história. Acompanha-se o drama adolescente de Hubert Minel, garoto de 16 anos que narra a difícil e conturbada relação com sua mãe, Chantal. 

Os pais de Hubert se divorciaram quando ele tinha 7 anos. Sua guarda ficou com a mãe e desde então, ele tem pouco contato com o pai. Porém, Hubert está naquela fase em que não consegue se entender de jeito algum com sua progenitora. Seus hábitos o desagradam. A decoração da casa, suas roupas espalhafatosas, a forma como ignora suas vontades, a comparação com outros garotos de sua idade, tudo o faz detestá-la. Esse sentimento, ele relata com detalhes em vídeos caseiros, que guarda em gavetas no seu quarto.

Em raros momentos, ambos tentam dar uma trégua as brigas e discussões, mas logo em seguida alguma altercação faz com que um dos dois exploda em ofensas, xingamentos e provocações. É como se mãe e filho não conseguissem viver de outra forma se não aos berros e acusações. A convivência entre Hubert e Chantal, torna-se angustiante para o espectador, pois está sempre à beira do limite, causando um efeito destrutivo na relação. Quando imagina-se que os dois finalmente vão se entender, vem um tsunami de ira de alguma das partes e inunda qualquer esperança de uma reconciliação definitiva. A situação só piora, quando Chantal fica sabendo por intermédio de uma conhecida, que o melhor amigo de seu filho, Antonin, é na verdade seu namorado. Descobrindo assim, a homossexualidade de Hubert. Magoada por não saber pela boca do próprio filho, Chantal nada diz, mas fica remoendo por dentro a falta de confiança e cumplicidade do filho para com ela.

Hubert, de sua parte, não suporta mais viver ao lado da mãe e encontra refúgio na casa do namorado e da sogra, que tem uma relação de carinho, harmonia, cumplicidade e companheirismo, bem diferente do ambiente que tem em sua própria casa. Também relaciona-se de maneira doce e amável com sua professora de francês, com quem divide momentos de pura poesia e amizade, lendo livros de grandes escritores e recebendo conselhos de como lidar com as dificuldades em casa.


Após tantos conflitos, Hubert é mandado pelos pais para um colégio interno, o que deflagra mais uma série de enfrentamentos e brigas. Revoltado, Hubert pega pesado e desfere sobre a mãe palavras chocantes. O que faz pensar que a relação de amor entre maẽ e filho jamais será recuperada. Depois de alguns meses, Hubert foge do colégio interno. Aparentemente exaustos do clima de guerra, Hubert e Chantal resolvem se encontrar para uma reconciliação definitiva. O ambiente não poderia ser mais propício, a casa onde Hubert morou com seus pais antes de se separarem. Lá, Chantal finalmente conhece Antonin e cercada por uma natureza exuberante, entre lembranças e recordações de uma vida feliz, mãe e filho fazem as pazes abraçados e recostados nas pedras cravadas em frente ao mar. A pergunta que fica no ar é: até quando?

EU MATEI MINHA MÃE é uma história que termina em aberto, porque na complicada fase da adolescência nada é definitivo, nem a bandeira branca hasteada entre pais e filhos em conflito. Mas o amor existe, e mesmo que seja difícil demonstrá-lo, ele está ali, suportando tudo em silêncio. 

Além da sensível e delicada história contada pelo talentoso Xavier Dolan de apenas 23 anos, o rapaz se mostra atento a detalhes que fazem toda a diferença. Ele põe um toque de sofisticação em sua direção, ao escolher uma trilha envolvente com solos de piano, cores vivas em uma fotografia exuberante, diálogos profundos, marcantes, closes estonteantes e um naturalismo que arrepia!

Amo Xavier Dolan! Amo EU MATEI MINHA MÃE!


domingo, 2 de dezembro de 2012

UMA DELICIOSA OVERDOSE DE REGINA DUARTE

Regina Duarte é visceral! Acho essa a palavra mais acertada para defini-la dentre tantos os adjetivos que poderia usar para elogiá-la. E digo visceral, não apenas como atriz, mas também como mulher, guerreira, batalhadora e apaixonada pelo ofício de atuar que ela é. Ela hipnotiza e comove apenas com seu firme e suave tom de voz, dentro e fora da ficção.

Fui hoje, conferir a exposição em sua homenagem, que proporciona ao espectador uma deliciosa viagem aos seus 50 anos de carreira. Poderia até ser suspeito pra falar, pois Regina é minha atriz preferida de todas de sua geração, mas falo com a boca cheia e sem nenhuma suspeita que está tudo maravilhoso. A exposição é um verdadeiro deleite para os fãs da atriz, como eu, e para qualquer pessoa que goste um pouquinho de novela e de arte em geral, vale muito a pena prestigiar esse trabalho belíssimo e caprichado que o curador Ivan Izzo preparou com tanto amor e carinho.

Ao entrar no Liceu de Artes e Ofícios aqui de São Paulo inicia-se um passeio fascinante pelos trabalhos de Regina, todos, sem exceção. São fotos, pessoais e profissionais, recortes de reportagens, cenas de seriados e peças projetadas em telões, entrevistas e cenas de diversas novelas espalhadas por televisores em cada cenário montado conforme a época em que foi exibido, objetos, figurinos, cartas, roteiros, camarins, tudo ao som das trilhas que embalaram cada trabalho marcante da atriz.

Ao adentrar o espaço já escuta-se "Futuros Amantes" na voz de Gal Costa, o que te coloca imediatamente no clima de uma viagem cheia de glamour e beleza, e passamos assim escutando "Tele-Tema", "Baby Can I Hold You", "Coração Pirata" e "Foi Assim" como se estivéssemos flanando pelo local. Fiquei lá quase três horas, mas a vontade era ficar muito mais pra explorar todos os detalhes que é impossível apreciar em apenas uma visita.

Visitar a Exposição: Espelho da Arte - A Atriz e Seu Tempo foi um programa bom demais, e o melhor, gratuitamente. Visitar o escritório de "Malu Mulher", entrar no espalhafatoso quarto da viúva Porcina de "Roque Santeiro" estar entre as sucatas da rainha Maria do Carmo e curtir o botequim da Raquel de "Vale Tudo" dentre tantos outros momentos, foi mágico, um  arrebatamento que se explica por uma grande "História de Amor" que tenho com a eterna namoradinha do Brasil.  

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

UMA PAIXÃO POR NOVELAS: "O AMOR ESTÁ NO AR"






Era o ano de 1997. No dia 31 de março, estreava as 18 horas O Amor Está No Ar, a nova novela das seis. Eu fiquei alucinado pra acompanhar essa história escrita por Alcides Nogueira e durante seus 137 capítulos não me decepcionei. Meu interesse pela novela começou desde as primeiras notícias, que davam conta que o triângulo amoroso principal seria protagonizado por Betty Lago, Rodrigo Santoro e Natália Lage, três atores que amo, principalmente Betty e Natália. À época, Rodrigo estava despontando como promissor galã, seu trabalho anterior tinha sido a novela Explode Coração, onde vivia um romance com uma mulher bem mais velha. Nessa trama então, estreava protagonista.

A história: A bela Sofia Shneider (Betty Lago) é casada com Vítor e tem três filhos com ele, a mimada e arrogante Beatriz, o doce Daniel e a rebelde Luísa (Natália Lage). Vítor é o proprietário da Estrela Dourada, empresa de turismo da Fictícia cidade de Ouro Velho. Após sua morte, Sofia assume os negócios da empresa, provocando a ira de Úrsula, sua sogra e grande vilã da trama, que detesta a nora e não aceita que ela assuma os negócios da família. Viúva, Sofia inicia uma grande disputa pelo poder com a maléfica Úrsula, que usa de todas as artimanhas para se dar bem, inclusive manipular os netos contra a própria mãe. Nesse balaio de gato entra Luísa, que é a neta adorada de Úrsula, e por sua vez, achando-se incompreendida pela mãe, que não entende suas atitudes intempestivas, vive em atrito constante com ela. No fundo, mãe e filha tem personalidades fortes e muito parecidas, por esse motivo não conseguem se entender e sempre batem de frente, causando um desgaste na relação.

Em meio a tudo isso, Luísa ainda tem alucinações, ela acredita ver OVNIs. O que a deixa bastante perturbada. Dividida pela disputa entre sua mãe e sua avó e confusa com suas visões, Luísa encontra o amor nos braços de Léo (Rodrigo Santoro). Ele é o novo aviador que chega à cidade para trabalhar na Estrela Dourada. O problema é que Luísa tem de enfrentar a apaixonada Cuca Chicotada, ex-namorada de Léo que não se conforma com o término do romance. Boa de briga, Cuca, que tem esse apelido por trabalhar como domadora de animais no circo do pai, Guima, tem grandes embates com Luísa, que também não leva desaforo pra casa.

Em dado momento, Luísa, que adora esportes radicais como motociclismo e jet ski, desaparece. A família toda se mobiliza em sua procura, principalmente Léo e Sofia, os mais desesperados com o sumiço da garota. O tempo passa e eles ficam cada vez mais próximos pela dor e o empenho em encontrá-la, mas Luísa não aparece e nem dá notícias. O que faz todos pensarem que ela sumiu por vontade própria. Léo e Sofia por fim passam a se acostumar com a ideia de que Luísa decidiu abandoná-los de vez, então surge um novo sentimento, os dois se apaixonam e começam a viver um romance secreto, para evitar falatórios maldosos. Eis que, quando estão prestes a assumir publicamente a paixão, Luísa reaparece.

Ela foi abduzida por um disco-voador e mantida em cativeiro por extraterrestres. Mas quem irá acreditar numa história dessas? Luísa se vê numa sinuca-de-bico após voltar a Ouro Velho. Ela não tem nenhuma lembrança do que aconteceu. Decepcionada e revoltada ao descobrir o caso entre sua mãe e seu namorado, ela não tem nem como provar que não desapareceu por livre e espontânea vontade, e todos sofrem. Luísa, porque ama Léo e se sente duplamente traída. Léo, porque ainda ama Luísa, mas acha que foi abandonado sem nenhuma explicação. E Sofia, porque ama Léo, mas ama mais a filha e não quer disputar o namorado com ela, que por sua vez não a perdoa.

Decidida a esquecer Leo, Luísa que a essa altura já não mora mais com a mãe, está vivendo na casa da avó e lá conhece o misterioso João, novo administrador dos negócios de Úrsula. Sente-se envolvida por ele, mas antes que aconteça algo mais o rapaz revela seu grande segredo. O fascinante administrador é o ET que abduziu Luísa. 

No final Léo e Luísa reatam, os dois vão morar juntos e fazem uma viagem de lua de mel ao Peru. Em meio as ruínas de Machu Picchu, João reaparece para o casal, provando a Léo que é realmente um ser de outro planeta, não deixando dúvidas de que Luísa nunca foi louca, como muitos acreditavam. Os dois terminam felizes e mais apaixonados do que nunca e Sofia encontra o amor nos braços de Pedro Olimpio, um rico empresário que compra de Úrsula a Estrela Dourada, pondo fim a disputa pelo poder.

A novela teve ainda outros destaques que me deliciaram. As hilárias Chimbica e Laíde foram um show à parte. Laíde era empregada na casa de Sofia e sonhava em ser famosa, tinha um namorado por correspondência que conhecia só por foto e soltava tiradas engraçadíssimas. Já Chimbica era de rolar de rir, num trabalho de composição perfeito, a atriz deu vida a uma balconista de açougue caipira e bem fofoqueira. Carla Fioroni e Vera Mancini estavam impagáveis e brilhantes em seus respectivos papéis.

Outro grande destaque foi Lady Francisco como Candê. Num dos melhores papéis de sua carreira, ela incorporou uma batalhadora dona de casa, forte e apaixonada pelo marido Guima, de Nuno Leal Maia, outro destaque. Capaz de enfrentar de igual pra igual, sem medo, a poderosa Úrsula, que teve um romance com seu marido no passado e ainda demonstrava ser apaixonada. Os embates entre Candê e Úrsula, eram os melhores. Úrsula, em atuação marcante de Nicette Bruno, nunca descia do salto, sua postura era sempre de alguém acima do bem e do mal, mas Guima era seu ponto fraco e sabendo disso, Candê tripudiava. Os enfrentamentos entre as duas, era sempre um deleite. Um banho de interpretação e emoção. Candê sempre humilde, bem povão e Úrsula sempre de nariz em pé.

O amor que Úrsula nutria por Guima também era uma trama envolvente. Mesmo muito apaixonada por ele na juventude, ela preferiu abrir mão desse amor, por ele ser de classe social muito inferior. Casou com um homem rico, ficou mais rica do que já era, mas nunca foi feliz e nunca esqueceu Guima. As cenas em que ela aparece sozinha, lembrando do passado e sofrendo ao som de "A Mulher Em Mim" de Roberta Miranda, eram de arrepiar. Eu ia ao delírio!

Os romances entre Camila (Ana Paula Tabalipa) e Rodrigo (Thierry Figueira); Ivan (Marcelo Faria) e Beatriz (Micaela Góes); Vicente (Tuca Andrada) e Cuca (Georgiana Góes) também eram interessantes.

A abordagem dos costumes judaicos através dos personagens Davi (Caco Ciocler) e Flora (Isabela Garcia), vivendo um romance cativante e Daniel (Patrick Alencar), prestes a comemorar seu Bar Mitzvá, também foi bastante enriquecedor pra trama. Os vilões Alberto e Júlia, vividos por Luís Mello e Nathália do Vale também estiveram impecáveis, assim como Monah Delaci esbanjando charme e sofisticação como a matriarca dos Shneider.                                                                                                                                                         Esta novela foi extremamente criticada em sua exibição. A audiência não foi das melhores. Muitos a acusavam de confusa e fantasiosa demais. Uma novela fraca enfim, tanto que nunca teve uma reprise. Pra mim uma grande pena, porque eu amei tudo nessa novela, cada detalhe. Foi uma novela diferente, ousada com a abordagem do tema "extraterrestre", jovem, solar, com um elenco bonito e extremamente competente. Uma novela pequena sim, mas uma pequena jóia. Sem sombra de dúvidas é uma de minhas novelas preferidas. Afinal de contas, não dá pra confiar no gosto da grande massa."" c

    

domingo, 25 de novembro de 2012

PESSOAS QUE FICARAM PELO CAMINHO

As vezes na vida, é inevitável deixar pra trás pessoas queridas. Quem viveu muito, sabe disso. Quem viajou bastante, conheceu pessoas diversas, viveu a vida intensamente e se entregou a cada momento com paixão, entende que, embora a vontade seja genuína, manter todos os amigos que semeamos pela vida a fora é quase uma utopia. Amizades, como plantas, não basta semear, necessita-se o cultivo, que com a transitoriedade da vida incorporada num espírito inquieto, torna-se tarefa árdua. Nem todos estão dispostos pra essa batalha cotidiana. Muito poucos estão.

Então, o tempo vai passando, vamos avançando em idade, fica mais difícil travar novas amizades. Temos meia dúzia de amigos (se tivermos muita sorte) que fazem parte do nosso dia-a-dia, mas de vez em quando bate uma nostalgia do passado, daquele alguém super especial que fez parte de uma fase da nossa vida, as vezes menos do que isso, apenas de um pequeno momento. Mas ficou marcado na mente e no coração de forma tão indelével, que você não entende o por que de não ter perdurado. E surge questionamentos como "por onde anda?", "por que perdemos contato?", "o que terá sido feito desse alguém?".

Vira e mexe eu penso em tanta gente. Gente que fez parte da minha infância, da minha adolescência e até bem pouco tempo atrás da minha juventude, antes dos trinta. Pessoas que surgiram na minha vida e despareceram com o tempo. Pessoas que ficaram pelo caminho. Essas eu chamo de cometa, como li uma vez num poema antigo. Pessoas cometa, que passam pela vida da gente mas não permanecem, ao contrário das estrelas, que são os amigos que não nos abandonam nunca, mesmo distantes.

Eu sou dedicado, me esforço, faço tudo o que posso pra não perder as estrelas de vista, mas está cada vez mais difícil mantê-las. E já não tenho mais paciência pra correr atrás delas, se não tem interesse mútuo, que se dane. Sou um homem de 31 anos, que já sofreu demais por amigos e amores e agora está mais interessado em amar a si mesmo e deixar que quem tiver interesse que busque meu brilho. Ainda assim, sou um ser das nostalgias e adoro me perder em lembranças boas do que passou e ficou congelado no tempo da delicadeza. 

Lembrar dos cometas me inspirou esse texto. Cometa como Dulce, que conheci a tanto tempo atrás que nem me lembro exatamente o ano, mas eu era menino, morava em Tramandaí, devia ter meus 9 ou 10 anos e ela era muito mais velha, praticamente uma babá pra mim. Mas eu não a enxergava assim. Via Dulce como uma amiga mesmo, amiga muito querida. Ela era de uma cidade no interior do Rio Grande do Sul chamada Estrela. Estava em Tdaí passando um verão, nos conhecemos e rolou um carinho imediato. Passei naquele verão com Dulce os dias mais doces de que tenho lembrança. Estranho uma amizade assim, de um garoto de 10 anos com uma mulher de quase 40? Pode ser, se eu não fosse eu e ela não fosse ela. Sempre me interessou amizades com pessoas mais velhas que eu, bem mais velhas, como foi o caso de Dulce e isso me acompanhou a vida toda, sempre me fazendo um bem danado. Só que Dulce passou, tal e qual um cometa. Depois daquele verão, nunca mais soube dela.

Da mesma forma Carmem, que conheci em Aracaju. Baiana de Feira de Santana, primeiro a conheci superficialmente, a via de longe mas não me aproximava muito. Até que pude conhecê-la de verdade e me surpreendi de uma forma apaixonante. Carmem era um furacão em ebulição de alegria, otimismo, bom humor e simpatia. Ela estar na minha vida, mesmo num curto período de tempo, foi um presente divino. Nessa época eu estava com 15 anos e Carmem era uma menina de 40. Não dava pra acreditar que ela tinha tudo aquilo, eu sentia toda aquela energia e era como se tivéssemos a mesma idade. Quando fui embora e tive que deixá-la, no dia da nossa despedida me deu um cordão de ouro, singelo e delicado. Provando mais uma vez que dentro daquela mulher que poucos levavam a sério, havia um coração gigantesco cravejado de brilhantes. Porém, após algumas tentativas de manter contato, Carmem acabou ficando no passado.

Foi assim também com Ísis, amiga do colégio. A melhor amiga de infância, na fase da terceira e quarta séries. Eu a admirava e tinha o maior orgulho de ser seu amigo. Era educada, inteligente, de boa família. Sempre frequentava a casa dela, a mãe e o padrasto eram uns amores. Tenho ternas lembranças da casa e da família de Ísis, das tardes que passávamos brincando de boneca, ouvindo e cantarolando músicas das trilhas de novelas como "Deus nos Acuda" e "Vamp". Depois de adulto consegui revê-la. Continuava a mesma garota simpática e educada de antes porém crescida, madura. Estudava letras e fazia planos pra morar um tempo nos EUA. A última vez que a vi foi em 2003, depois nunca mais.

E aconteceu do mesmo modo, logicamente em proporções diferentes, com Antônio, com quem tive dois encontros, após conhecê-lo via internet em 2009, mas não consegui esquecê-lo. Alguma coisa de especial ele me deixou nesse curtíssimo período em que estivemos juntos. Com Fernando, que vivi uma intensa amizade por dois anos, com momentos hilários e antológicos, antes de se dissolver no ano de 2007. Com Nathália, colega no curso técnico de nutrição e no estágio, com quem convivi por um ano em 2003/2004 e ri desbragadamente. Nathália era um remédio letal contra o mau-humor e o preconceito. Que saudades dessa guria que eu nunca mais vi! Com Angélica, que me ajudou num dos momentos mais difíceis da minha vida. Com Alexandre, que jamais imaginei poder ficar sem sua amizade, depois de ter entrado em minha vida. Foi o amigo mais incrível que já tive, mas ele mudou e me tirou de sua vida. Com Isadora, também da escola, que escreveu assim em minha agenda: "A amizade é como o cristal, depois de quebrar nunca mais será igual. De alguém que te adora, Isadora!" Quebrou muito rápido, mas durou o suficiente pra se tornar inesquecível. E com Gregório e Tiago. O primeiro me cativou em apenas uma semana, passava férias na cidade em que eu morava. Greg foi um bálsamo numa fase em que eu me achava uma coisa estranha, me fez sentir normal. Sou agradecido a ele até hoje por isso, mas ele com certeza nem imagina o efeito maravilhoso que causou em mim. Éramos crianças, início dos anos 90, pré-adolescentes. Imagino o homem lindo que ele deve ter se tornado, mas acho que nunca saberei, como saberei menos ainda de Tiago Girardi, que conheci e conversei por apenas algumas horas numa noite de verão de 1993 e nada mais. Mas o menino loiro de 10 anos, fazia aniversário no mesmo dia que eu, e era tão bonito e carismático que jamais consegui esquecê-lo. Já o procurei nas redes sociais, mas não o acho de jeito nenhum.

E assim, são as pessoas cometa. Pessoas que nos fazem feliz, mas que vamos deixando pelo caminho. Ou será que são elas que nos deixam, depois de terem cumprido sua missão?

domingo, 18 de novembro de 2012

DA SÉRIE: OS FILMES DA MINHA VIDA - SEGUNDAS INTENÇÕES (10)

Junho de 1999. Estou desacompanhado no cinema do shopping Catuaí, em Londrina. Folheio uma revista erótica, que acabei de comprar, no escurinho, antes de começar a sessão. Gostinho de proibido. As luzes se apagam totalmente. No telão, o filme SEGUNDAS INTENÇÕES. Sarah Michelle Gellar, Ryan Phillippe e Reese Witherspoon no auge da juventude, são os protagonistas de uma trama sensual e sórdida. 

Kathryn (Sarah) e Sebastian (Ryan) são meio-irmãos. O pai dela é casado com a mãe dele. Ricos, fúteis e inescrupulosos, eles não medem esforços pra conseguir o que desejam. Enganar, manipular e jogar com os sentimentos alheios é algo divertido e muito prazeroso para a dissimulada Kathryn. Já para Sebastian, conquistar o maior número de garotas e provar ao mundo seu inabalável poder de sedução é o que o move.

Porém, Kathyn é a única mulher que Sebastian ainda não conseguiu ter. Justamente por conhecer o "irmãozinho" muito bem, ela conseguiu manter-se intacta a seus assédios. Mas, Sebastian não desiste de levá-la pra cama, até que surge a grande chance.

Kathryn é abandonada pelo namorado, que a troca pela manipulável Cecile (Selma Blair). Como não está acostumada a perder nada, ela não aceita ser trocada e tenta usar Sebastian num plano para se vingar da garota, onde ele a usaria, transando com ela, pra provar pro namorado que ela não passa de uma vagabunda. Fazendo seu ex se arrepender de tê-la deixado. Sebastian por sua vez acha o desafio fácil demais e acrescenta uma outra proposta. Além de acabar com a reputação de Cecile, ele seduzirá e tirará a virgindade da doce e ingênua Annette (Reese), a filha do futuro diretor da escola preparatória que irão frequentar. Sebastian fica instigado a conquistar Annette, após ler uma reportagem em que ela afirma que pretende se manter virgem até o casamento.

Sem acreditar que seu meio-irmão conseguirá tal feito, Kathryn aposta. Se ele vencer levando a meiga e inocente Annette pra cama, ela será sua. Do contrário, o carro de Sebastian, um magnífico Jaguar 56, será dela. Desafio feito, desafio aceito. Sebastian e Kathryn só não imaginavam o que sentimentos verdadeiros e nobres como os de Annette, são capazes de fazer com corações pérfidos como os deles. 

Daí em diante um desfile de intrigas, chantagens e dissimulações culmina num marcante e emocionante desfecho ao som da sensacional Bitter Sweet Symphony do The Verve.


Simplesmente inesquecível!

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

UMA GUERRA MUITO SEM GRAÇA


Fã de novela desde criança que sou, hoje inauguro aqui um novo espaço pra falar de mais essa paixão. Pra começar, em vez de tecer elogios e homenagear alguma trama que marcou minha vida e se cristalizou em minha memória afetiva, vou falar da atual trama no ar às 19 horas da Rede Globo, o remake da tão cultuada "Guerra dos Sexos" de 1983 de Sílvio de Abreu.

Foi com empolgação que recebi a notícia, a uns dois anos atrás, de que a novela com Paulo Autran e Fernanda Montenegro, famosa por revolucionar o horário e o próprio produto em si, com sua comédia pastelão rasgada, ganharia uma nova versão. Quando foi confirmado pela imprensa o tal remake, estava no ar a segunda versão de "Ti Ti Ti", uma delícia de novela, reescrita com maestria pela competentíssima Maria Adelaide Amaral. Por considerar Sílvio de Abreu tão competente quanto Maria Adelaide, ou talvez até mais, por esta ter sido sua pupila, colaborando com diversas obras suas, imaginei que uma nova versão de "Guerra dos Sexos", tão aclamada pelos saudosistas de plantão, seria um grande sucesso, tanto quanto estava sendo "Ti Ti Ti" na época. Me enganei redondamente!

No ar a pouco mais de um mês, ainda pode ser cedo pra dizer se a novela será sucesso ou não, mas já dá pra saber com certeza se é boa, e ela não é. Gosto de dar esse tempo mínimo de um mês pra julgar se uma trama tem realmente pegada, embora dê pra perceber isso logo no primeiro capítulo, com raras exceções. Foi o caso de "Lado a Lado" e "Salve Jorge", respectivamente as atuais novelas das 18 e das 21 horas. Logo no início já senti que "Lado a Lado" era um trabalho delicado, cuidadoso, com trama consistente, um elenco belíssimo, atuações impecáveis e uma ótima história, sem falar nos figurinos e fotografia, tudo impecável. E "Salve Jorge", embora com ressalvas, por tramas anteriores de Glória Perez nada novidadeiras, também me surpreendeu logo de cara, era a mesma Glória Perez só que melhorada. Mais requintada, cautelosa, consistente. Gostei e continuo gostando. Mas "Guerra dos Sexos" definitivamente não me desce. Foi sucesso, foi inovadora, o elenco foi brilhante, mas foi, passado, pretérito imperfeito, não é mais!

Desnecessário dizer que o enredo é completamente datado e eis aí o grande erro de Sílvio, achar que a tal guerra dos sexos nos dias de hoje renderia uma boa história. Não rende. Isso é tão anos 80 e talvez um pouco anos 90, mas jamais anos 2000, muito menos 2012.

"Guerra dos Sexos" 2012, não empolga de jeito nenhum. Apesar do elenco estelar, não há Glória Pires, Irene Ravache, Mariana Ximenez ou Tony Ramos que dê jeito. Este último aliás, está me dando nos nervos, nunca tive tanta antipatia por um personagem de Tony, como estou tendo desse nojento do Otávio com aquele bigodão branco asqueroso. Nota-se um ranço de anos 80 em cada detalhe. O autor parece querer tanto manter a obra fiel a original que não conseguiu modernizar a história, está lá, tudo igual a obra de 83. E como eu sei disso, mesmo não tendo assistido a versão original? Porque diálogos, interpretação, trilha sonora, cenários e situações me soa extremamente demodê, como a própria palavra.

Mariana Ximenez é linda e talentosa, todo mundo sabe, mas qual a graça de sua Juliana? Que trama mais boba o triângulo amoroso entre ela, Fábio e Manuela! E pra completar a sem "gracisse" da história, me aparece um novo pretende vivido por nada mais nada menos que Jesus Luz. Enquanto isso, o apaixonado Nando de Gianecchini, numa versão mais light do Paschoal de "Belíssima", vai ficando em banho-maria causando a paixão da madura Roberta Leone, que apesar de ser feita pela diva Glória Pires, sempre perfeita, tenho quase certeza que não encanta como deve ter encantado Glória Menezes com sua primeira Roberta.

Já Drica Moraes é sempre um deleite, mas sua Nieta é mais um caso de personagem que ficou datada, assim como sua filha Carolina. A vilã interpretada por Bianca Bin é inacreditavelmente ultrapassada, parece até vilã de desenho animado. Suas falas são cheias de frases feitas, chega a dar vergonha. E as situações que ela provoca, como a cena em que finge brigar com Manuela para que Fábio pense que as duas não tem mais nenhuma ligação? Medonha. Ainda na família de Nieta, temos Nenê e seus galanteios a Dona Semírames, personagens que com certeza não surtem o mesmo efeito que antigamente.

Quanto aos protagonistas-mor, sabemos que Irene Ravache é fabulosa e pode fazer coisas magníficas como Katina (Belíssima), Loreta (Eterna Magia) e Clô (Passione) e que Tony Ramos é um ator que despensa comentários, mas Charlô e Otávio serão pra sempre em suas mãos apenas fantoches, vida de verdade eles só tiveram uma vez quando encarnaram no corpo de Fernanda Montenegro e Paulo Autran. Assim como toda a novela, que hoje me parece apenas um rabisco muito mal feito do que um dia foi grandioso.

     

domingo, 4 de novembro de 2012

O QUE VOCÊ DEMORA É O QUE O TEMPO LEVA...

Voltou ao Brasil após 15 anos na Europa. Partiu para viver em Granada, na Espanha, aos dezoito anos, onde se formou e fixou residência. Deixou pra trás uma pendência. Um sentimento, um sonho, uma possibilidade. Um desejo não consumado. Foi embora com o gosto daquele beijo e a lembrança das carícias trocadas em segredo, que se cristalizaram em sua memória.

Na noite da despedida, ela namorava Lucas e João Pedro namorava Alice. Após algumas cervejas, garrafas de vinho e baseado, não demorou muito a perceber que os pares estavam trocados. Sentiu-se irremediavelmente atraída por aquele que não era seu namorado e foi correspondida. Em meio a madrugada, aproveitaram o sono de seus respectivos pares e aqueceram-se em frente as últimas fagulhas da fogueira que fizeram no início da noite, tomaram mais vinho, envolveram-se em um cobertor e trocaram fluidos intensos. Toques. Afagos. Suspiros. O coração descompassado. Tudo muito novo e quase assustador. Não imaginaram aquele envolvimento, não planejaram, apenas aconteceu e foi tão profundo, que ela já começara a imaginar como contar a Lucas que não era ele que queria. Mas, a outra parte recuou, não tinha estrutura psicológica pra enfrentar aquela situação, sua relação já tinha mais tempo que a dela e preferia manter em segredo o acontecido, não queria magoar ninguém.

Agora, Lídia voltara disposta a reencontrar esse amor do passado. Queria saber o que tinha acontecido com sua vida, se ainda pensava nela ou se conseguiu esquecê-la. Ao chegar no hotel, dormiu algumas poucas horas, ansiosa. Tomou um banho morno ao acordar, secou o cabelo com secador, passou creme pelo corpo, pôs uma maquiagem leve. Uma chuva fina caía insistente. Colocou o endereço na bolsa. Nervosa, preferiu pegar um táxi a dirigir. O peito cheio de esperanças, depois de tanto tempo reencontraria a mais doce e inesquecível recordação de sua adolescência.

Respirou fundo. Apertou a campainha do apartamento 13. A porta se abriu. Ele estava ali, na sua frente, barba, cabelos loiros um pouco mais longos, lindo, homem feito. Nem de longe lembrava o garoto impetuoso de quinze anos atrás, mas reconheceu-o na hora. Era ele, João Pedro. Ficou um pouco confusa.

"João Pedro! É você?"

"Sim Lídia, sou eu. Fiquei tão diferente assim? Vem cá, me dá um abraço."

Lídia voltou ao passado ao sentir o abraço afetuoso de João Pedro. Adentrou o apartamento. Acomodou-se no sofá da sala.

"Fica à vontade Lídia. Nossa, já faz tanto tempo! Como você tá? Quando voltou?"

"É, bastante tempo. Quinze anos! Mas eu tô bem, como você pode ver. Cheguei ontem."

"Ontem?! E já veio rever os velhos amigos? Isso que é saudade hein. Mas nós também sentimos muito a sua falta! Você bebe alguma coisa?"

"Não se preocupe comigo. Eu quis vir logo, porque não tenho muito tempo a perder."

"Entendo. Você se tornou uma mulher muito ocupada. Uma mulher de negócios. Mesmo assim, eu vou preparar um drink pra gente."

"Eu aceito, se você tiver um chá."

"Um chá?"

"Sim, você tem?"

"Chá é o que não falta nessa casa. Que sabor você quer?"

"Pode ser de frutas cítricas."

"Espera um minuto enquanto ponho a água pra ferver."

Enquanto João Pedro estava na cozinha, Lídia reparou no Porta-retrato na estante e seu coração parou por um segundo. Agora tudo fazia sentido. Em seguida, João chegou com o chá.

"Você se casou João Pedro?"

"Sim. Você viu o retrato? Sabe quem é ela?"

"Alice"

"Claro, a Alice. Vocês eram inseparáveis lembra?"

"Eu não podia imaginar. Achei que fosse só um namoro de adolescência."

"Pois é. Acontece que entre idas e vindas, a gente acabou descobrindo que fomos feitos um pro outro. Até tentamos te mandar um convite pro casamento, mas seus pais disseram que você tava atolada de compromissos e infelizmente não ia poder comparecer."

"Meus pais. Típico deles, responder por mim."

"Você não ficou chateada né?"

"Claro que não. Quanto tempo vocês estão casados?"

"Completamos oito recentemente. Tivemos aquela crise típica dos sete anos, mas sobrevivemos."

"E onde ela está agora?"

"Foi buscar Isabela no colégio, já já ela tá por aí, vai adorar te ver!"

"Quem é Isabela?"

"Nossa filha. Tem 6 anos. Uma graça!"

Lídia quase engasgou com a resposta de João Pedro.

"Mas e você? Fala de você, dos seus negócios na Espanha. Tá casada, solteira, divorciada? E o Lucas? Vocês namoravam na mesma época que eu e Alice começamos, lembra? Pretende vê-lo?"

"O Lucas é coisa do passado. Brincadeira de criança. E a gente não namorava, só ficava de vez em quando. Eu achava que acontecia o mesmo entre você e Alice, nunca imaginei que fosse tão longe."

"O Lucas gostava muito de você. Mas você sempre foi meio distante né Lídia."

Nesse momento Alice chega com Isabela. A pequena corre para os braços do pai. Alice surpreende-se com a presença de Lídia tantos anos depois. Isabela quer saber quem é a visita.

"Essa é Lídia, uma velha amiga do papai e da mamãe."

"Oi Lídia."

"Oi Isabela."

"Como vai Lídia?"

Alice pergunta ainda surpresa

"Muito bem Alice e você?"

"Pode apostar que completamente surpresa"

João pede licença a Lídia e avisa que vai preparar o banho de Isabela, enquanto as duas ficam a vontade pra pôr o papo em dia.

Sozinhas na sala, finalmente Lídia consegue cumprir seu propósito ali. 

"Vejo que o João te serviu um chá, aceita uns biscoitos pra acompanhar?"

"Não Alice, tá tudo bem assim."

"Mas me diz, que novidade é essa depois de tanto tempo?"

"Voltei por sua causa Alice."

"Por minha causa? Como assim?"

"Você esqueceu?"

"Esqueci de que? Do que você tá falando?"

"De nós duas, aquela noite no acampamento, na beira da fogueira, envoltas num cobertor velho, dividindo a mesma garrafa de vinho no gargalo."

"Você ficou louca? Me aparece aqui na minha casa, 15 anos depois, pra ressuscitar uma história que aconteceu em outra vida. Olha a sua volta Lídia, essa é minha casa, eu sou uma mulher casada, tenho uma filha, uma família. O que deu em você, pirou?"

"Eu não sabia de nada disso, nem entendendo. Por que você fez isso? Porque se casou com o João Pedro?"

"Por que? Você se abala de lá da Espanha até aqui pra saber por que eu, uma mulher de 32 anos, me casei com o homem que era meu namorado desde adolescente e formei uma família, é isso?"

"Eu amo você Alice, eu sempre te amei, vivi todos esses anos te amando. Aquela noite nunca mais saiu da minha cabeça. Quando eu decidi te procurar, imaginei que você pudesse estar comprometida, sabia que esse era um risco que eu corria, mas não com um homem."

"Mas você achou que eu fosse o que? uma lésbica como você? Sinto muito, mas o que aconteceu entre nós naquela noite, foi só um deslize, no máximo uma experiência."

"Tem certeza disso Alice? Eu vim disposta a levar você comigo, pra que a gente pudesse viver o que foi interrompido no passado. Eu rompi um relacionamento de dez anos pra vir em busca de você, mas eu não sei amar sozinha. Se você me disser não definitivamente, eu vou pra nunca mais voltar, e dessa vez eu prometo ser apenas uma vaga lembrança de outra vida."

"Meu Deus, eu tô perplexa! Já tinha ouvido falar de como vocês lésbicas, são intensas, impulsivas e até um pouco loucas, mas eu não pensei que fosse tanto."

"E eu pensei, que quando você se recusou no passado a terminar tudo com o João Pedro e ficar comigo, era porque tava confusa, assustada, mas que ia passar e você ia assumir aquilo que é de verdade. Porque eu sei o que você é de verdade Alice, por mais que negue. E se quiser continuar sendo uma covarde, se escondendo nessa fachada que você criou de família feliz, é um direito que lhe cabe. Se mudar de ideia e resolver de uma vez por todas tornar-te quem tu és, não esquece, que é melhor tarde do que nunca. Nesse envelope tem os endereços e os contatos do hotel que eu estou aqui e da minha residência em Granada. Fico no Brasil por no máximo mais 10 dias. Adeus ou até logo!"

Deixou o envelope na mesinha de centro e se foi. Alice segurou-o e apertou contra o peito. Lídia tinha razão, se ela seguisse o seu coração, não pensaria duas vezes, se atiraria em seus braços e consumaria o desejo encubado ali mesmo naquela sala, depois arrumaria as malas e partiria rumo a Espanha para viver o único e verdadeiro amor que sentiu na vida. Mas havia João Pedro, que era um bom marido. Havia Isabela, que era sua razão de existir. Havia os parentes, que não suportariam o vexame. E havia sua imensa covardia, que era maior que qualquer outra coisa.

quarta-feira, 31 de outubro de 2012

LONDRINA

Cheguei numa madrugada de fevereiro de 1997. Era cinco da manhã. As folhas das árvores dançavam lentamente ao sabor da brisa suave da escuridão. Carregava o peito cheio de esperança e medo, mas ao percorrer aquelas ruas limpas e largas rumo ao meu novo lar, senti que poderia ser feliz naquele lugar. Gostei da cidade e do ar de glamour que ela exalava. A primeira impressão foi de encantamento. Imaginei que os primeiros raios de sol me traria agradáveis surpresas.

Tinha saído de uma cidade nordestina no estado de Sergipe, um lugar sem muita beleza, tirando as praias, e nenhum glamour, o extremo oposto de Londrina, mas onde vivi os melhores dois anos da minha vida. Convivi com pessoas, calorosas, hospitaleiras, alegres, fiz amigos muito especiais e passei por experiências que só se vive uma vez, como o primeiro beijo e o primeiro amor. Por isso ao partir fui em prantos. Sem opção de escolha, só me restava torcer para que tudo desse certo e eu pudesse encontrar pessoas tão incríveis quanto aquelas que estava deixando pra trás.

Londrina é a segunda maior cidade do estado do Paraná, fica na região Norte e possui mais de 500 mil habitantes. É uma cidade agropecuária, sendo bastante famosa pelo cultivo de café. Também tem uma das melhores universidades estaduais do Brasil, a UEL (Universidade Estadual de Londrina), atraindo assim estudantes de todo o país. Sendo assim, é uma cidade relativamente rica, que abriga muita gente esnobe.

No início foi bem difícil a adaptação. Acostumado com gente e hábitos simples, de repente me deparei com pessoas que tinham muito mais do que eu em sentido material. Carro, casa própria, escolas particulares, viagens internacionais, lugares caros. E eu, que nunca havia me sentindo desvalorizado por ser pobre, comecei a me sentir discriminado e foi uma das piores sensações que já tive. O ambiente não era propício, havia um desencaixe entre eu e aquela nova sociedade que se desvelava diante de mim e isso me matava. Eu queria, precisava desesperadamente fazer parte de algo, me sentir inserido, como era em Aracaju.

Como era em Aracaju nunca foi, mas aos poucos as coisas foram se encaixando. Comecei a ir muito ao cinema, principalmente no Shopping Catuaí. Apesar de amar cinema, nos dois anos que vivi em Aracaju não fui nenhuma vez, lá eles não tem muito o hábito, mas outras coisas compensavam essa falta. Em Londrina recuperei o prazer pelo cinema. Outra coisa gostosa, que eu adorava fazer, era caminhar no Parque Igapó, que ficava nos arredores da minha casa, localizada num bairro delicioso próximo ao centro. Pessoas de todas as partes da cidade frequentavam o Igapó, para se exercitar, passear, namorar, ensaiar, etc... Lá, tinha uma concha acústica onde o povo ensaiava peças, coreografias e de vez em quando até rolava uns shows. Me lembro de um do Chico César, que vi e ouvi de relance ao passar por lá numa noite. Tinha também a Feirinha da Lua, todas as noites de quarta-feira. No meio da semana era de lei passar lá pra comer o melhor pastel da cidade. Próximo de casa tinha também o Moringão, um salão grande, onde ocorria diversos eventos, como formaturas, shows, competições, eventos religiosos. Uma vez fui num show do Cidade de Negra com a Kássima, uma colega do colégio. O Super Muffato o melhor mercado da cidade, na minha opinião, pertinho de casa, chamado carinhosamente de Muffatão. O Valentinno, um bar gls, que da janela do meu quarto eu via os fundos e ficava imaginando como seria lá dentro. Alguns anos depois eu mataria minha curiosidade.

Eu morava com meus pais num apartamento simples mas aconchegante, na rua Raposo Tavares. Estudava no melhor colégio público da cidade, a Escola Estadual Professor Vicente Rijo. Quando comecei estava na sétima série e foi muito bom. As pessoas não entendiam como eu tinha conseguido vaga tão rápido, já que quem vivia lá a mais tempo não conseguia se matricular, a escola era exigente pra aceitar novos alunos. Nunca soube o motivo, só sei que me matriculei sem grandes dificuldades, penso que justamente por ser de fora, eles me deram preferência. Minhas primeiras amigas foram a Kássima e a Ângela. Vivíamos grudados, dentro e fora da escola. Quando acabava as aulas, ficávamos de papo nas esquinas, as vezes íamos pra praça, pro shopping, tomávamos sorvete e ríamos. Ríamos de tudo, por qualquer bobagem, tudo era alegria, tudo era maravilhoso. Tínhamos 15, 16 anos, tínhamos obrigação de ser feliz. Todos gostavam de Kássima, ela era popular, expansiva, grandona e bonita. Quem não gostava dela tinha inveja, geralmente meninas que a encaravam como rival. Ao lado dela eu ficava mais feliz que pinto no lixo, o bulliyng que me perseguiu em todas as escolas, diminuiu bastante, quem não falava comigo, pelo menos me deixava quieto. A pergunta que não queria calar, era por que uma garota tão popular como ela havia me feito seu melhor amigo. Eu era o novo brinquedinho dela, o amigo gay que ela queria exibir pra todos, mostrando como era moderna e descolada. Demoraria algum tempo até descobrir sua verdadeira personalidade.

Paralelamente aos colegas da escola, outras pessoas bacanas foram surgindo na minha vida. A Cláudia era vizinha, morava no mesmo prédio que eu. Divorciada, tinha dois filhos, Paula e Douglas. Era massagista e uma ótima contadora de piadas. Fazia o melhor arroz que eu já comi na vida. Sonhava em conhecer a Suécia, onde vive hoje. A Martinha, também morava no prédio. Era magrinha, pequenininha, quieta, mas muito querida. Solteira, morava sozinha. Trabalhava na biblioteca do Colégio Anchieta. No mesmo prédio ainda morava a Leda com o filho Luís Henrique. E aquela que se tornou minha maior amiga, confidente e companheira Luzia Gondim, com quem trocava figurinhas sobre filmes em papos intermináveis. Essas foram as primeiras pessoas com quem formei um círculo de amizade. Fazíamos churrascos maravilhosos, varávamos madrugada a dentro jogando um carteado, nos acabávamos em rodízios de pizza e era bom demais!

Foram cinco anos em Londrina, cinco intensos anos. Morei em três casas diferentes. Primeiro foi no prédio da Raposo Tavares. Depois fomos pra uma casa na rua Canudos, ainda no mesmo bairro e por fim mudamos para o Jardim San Remo, onde vivemos na rua Uberlândia até o último dia. 

Com o passar dos anos fui conhecendo outras pessoas e estreitando laços. Na escola fiquei muito amigo da Vívian e da Nadege, essa quase uma irmã pra mim. Vívian era tão espetaculosa, como eu gostava daquela menina, galinha e piranha na boca de muita gente, mas verdadeira e autêntica pra mim. Nadege era um sonho, doce, meiga, carinhosa, generosa. Minha irmãzinha do coração. Já estava na oitava série quando fiquei mais próximo das duas. Nesse período, Kássima já se mostrava interesseira, calculista, alguém não muito confiável e fui me desapegando aos poucos. Naquele ano, montamos uma peça e fomos entrevistados num programa de televisão local por causa dela. Foi um momento memorável! Nossa turma era a melhor, éramos unidos, tínhamos uma intimidade natural de pessoas que conviveram diariamente durante dois anos, mas quando o fundamental acabou uma nuvem negra pairou sob o meu coração. Estávamos separados no ensino médio. Pra mim particularmente foi péssimo, serviu pra que me afastasse definitivamente de Kássima e isso não foi tão ruim assim, porém, Vívian mudou de colégio e Nadege foi pra outra turma. Eu estava sozinho, cercado por um monte de gente estranha dentro da sala de aula e o bulliyng voltou com força total.

A situação estava horrível na escola, me encontrava com Nadege em todos os intervalos, mas não era o suficiente pra deixar de me sentir péssimo, as aulas eram um tormento perto de toda aquela gente com quem não tinha nenhuma afinidade. Na vida fora da escola, as coisas tinham que ficar um pouco melhores. Conheci gente nova, a Erica e sua irmã Eliane. A Fernanda, a Amanda e a mãe delas, Vânia. Foram pessoas essenciais pra tornar o tempo que passei em Londrina significativo, algo que realmente valeu a pena. Nesse mesmo ano eu e Erica fizemos um curso de cabeleireiro, que deixamos pela metade. Foi também o ano que comecei a frequentar as audições de piano dos irmãos Pâmela e Stellios, que moravam na mesma rua que eu, a Uberlândia e vez ou outra me convidavam pra um café, onde era servido um patê maravilhoso de berinjela, receita da terra do pai deles, a Grécia.

Em 2001, último ano na escola e também na cidade, fui questionado se gostaria de mudar de turma. Não pensei duas vezes, escolhi a turma onde Nadege estava e foi perfeito, nossa amizade se fortaleceu de tal maneira, que eu tive certeza que ia levá-la pra vida inteira. E aquele ano foi sensacional. O aniversário da Nadege. Vívian me levando ao Valentinno. A festa surpresa nos meus 20 anos. Minha primeira balada gls. E tantos momentos ínfimos que se tornaram grandiosos em minha lembrança afetiva. Risadas, encontros, dancinhas, a solidão de noite na janela do quarto, fofocas, picuinhas, ciúme, rejeição. O show da Cássia Eller, o primeiro emprego, estudar de noite. O carro arranhado, as músicas da Adriana Calcanhoto, "O Terceiro Travesseiro", "Fica Comigo Gay", "Presença de Anita", o retorno daquele primo, as cartas trocadas, "Disque Amizade", a tarde dos meus 17 anos esperando o ônibus na chuva.

Assim foi Londrina em minha vida, uma imensidão de emoções, descobertas, amadurecimento. A transição de um adolescente pra um adulto. Enquanto estive lá, eu achei que não amava. Hoje posso afirmar, eu amei. Ah, como eu amei!